HERDAR – Sérgio Alcides

Herdar

Sérgio Alcides

 

Para herdar, nasço de novo.

Arrebento a casca óbvia

de não ser órfão.

                                 Arranho

minha pele nos caquinhos

de um desamparo ideal,

mais futuro que o presente,

que me despede, me despe.

Venho muito humano e cru,

sem espinho nem chocalho,

nem nenhum veneno próprio

de que saiba proteger-me.

Renasço do mesmo jeito

como vim ao mundo, só

menos mínimo, mais gasto,

porque já nasço crescido,

sem berro que possa abrir,

nem mão enluvada que

me apare. Herdar, outro parto.

E eu que nascera perfeito,

desta vez mais-que-perfeito

venho, porque tenho agora

mais comigo o que faz falta.