Cinquenta e sete vezes – Fellipe Lee

Cinquenta e sete vezes

 Fellipe Lee*

 

Vincent Van Gogh

Vincent Van Gogh

Atravesso o longo sonho.

Estou aqui, ao teu lado, enquanto dormes. Silêncio.

As

formigas estão no teto,

a grama

é

verde,

o céu escuro, eu frio. Eu tento ser

palhaço,

no

humor

que não existe, na solidão sem

ventos.

O

segredo, que guardas de

mim

em tuas memórias – será teu! Leva a

casa que moramos, o quarto, a cama, os

len

çóis –

leva para o teu sono. O teu rosto não é

o mesmo, as tuas mãos e os teus pés

são

como a noite.

Esse longo

sonho não termina,

ele continua no labirinto infindo, um sonho

surreal,

tão

próximo do escuro inicial. Canto às

lembranças, para formarem vida e quebrarem

as pedras mais duras,

mas

as mãos estão

fracas. Esse vestido vermelho

precisa se molhar na chuva

de

inverno, e secar no calor

da

primavera.

Teus olhos

me enxergam.

O que

é

secreto será secreto.

Não há beijos

como

os teus.

Eu

quase quebrei as paredes,

antes

de subir aquelas

escadas.

As tuas mãos me

enxergam. Na pascoa ganho

chocolates. Aquele

dia, fotografei o teu corpo com

a minha mente. Teus cabelos molhados, a toalha nos

pés, as tuas mãos acima

das coxas,

um sorriso que

foi meu. Dez segundos. Vesti o teu corpo de novo,

com

a camisola amarela. Silêncio.

Estás

chorando. Eu também.

É

mágica,

ou algo nosso?

Os

pingos da chuva

na rua,

os pingos ao desligar o

chuveiro, os pingos que

enchem a chaleira, do chá que me

cura a agonia, que me

traz o frio, que me

acolhe no teu colo, que me traz

o teu jeito de

volta, as tuas

confusas sensações, as tuas singelas pinceladas na

cartolina branca. Os

teus óculos

ao assistir filmes

no meu

colo, a tua blusa de lã vermelha, o caminhar na

praia, em busca de conchas, leva-me aos teus sonhos mais

íntimos, leva-

me ao

findar das melodias

mais

 

*Aluno do curso de Artes Cênicas da UFSC.