Intercâmbio Brasil/Peru de Mulheres Negras: relatos e reflexões – Roberta Lira
Intercâmbio Brasil/Peru de Mulheres Negras: relatos e reflexões
Roberta Lira*
“A Beleza de Nossos Corpos Negros” – criado pelo Coletivo Kurima[1] e pela KurimaBantu Mulheres Mudempudiro[2], no Dossiê Kurima: Estética Negra (2015) – é um projeto/exposição criado para o protagonismo negro que inclui umensaio fotográfico de estúdio, realizado por equipe profissional e acadêmica (com maioria de mulheres negras), comrecorte de gênero e raça, tendo como modelos estudantes, professoras/es, técnicas/os administrativas/os, terceirizadas/os e frequentadora/es negras/os da Universidade Federal de Santa Catarina. O projeto inédito em Santa Catarina vem dar visibilidade à presença negra trazendo faces da rica diversidade da comunidade negra da UFSC. As imagens resultantes compõem a exposição, documentário e livro que rompem coma ideia de uma Santa Catarina que não tem povos negros, como com a sistemática ausência desse grupo étnico-racial numa sociedade estruturada pelo racismo e pelo pensamento colonial.
Nossa presença e imagens negras são excluídas dos espaços das artes visuais, das artes da cena, do audiovisual, das artes plásticas etc., frequentemente limitados pelo sistema de cotas e por olhares que nos estereotipam. Desse modo, o projeto contribui para o fomento, a visibilidade e a afirmação dos povos afros bem como para a cultura africana. Por que vemos uma maioria de pessoas brancas nas imagens em nosso país? Por que não nos vemos nesses espaços? Pessoas negras pouco aparecem em veículos de comunicação, em mídias e em produções artísticas, numa evidente contradição com a realidade étnico-racial brasileira de maioria negra: somos 54% da população. Em Santa Catarina, somos 17% da população e não constatamos nossa presença nos espaços sociais mais diversos. Porque existem tantos espaços brancos?[3]
O Coletivo Kurima e a KurimaBantu Mulheres Mudempudiro atuam há seteanos na universidade e na sociedade, com o objetivos de investigar, agir, criar, produzir, estudar fomentar e refletir sobre as questões negras principalmente, criando espacialidades negras que tornam possíveis o crescimento pessoal,intelectual e a ampliação das relações humanas na perspectiva dos povos de matrizes africanas. A exposição[3] é interativa, com rodas de conversa e atividades culturais que discutem temas como: corpo e corpo negro, identidade, raça, arte e cultura negras, história, relações étnico-raciais e raciais, representatividade, normatividade, racismo, branquitude e desconstrução de estereótipos.
A Beleza de Nossos Corpos Negros está em circulação a mais de dois anos no Brasil e teve importantes desdobramentos internacionais.O projeto Intercâmbio Brasil/Peru de Mulheres Negras: Empoderamento como Ferramenta de Desenvolvimento, Igualdade e Justiça, foi um destes desdobramentos internacionais que incorporou o Dossiê Kurima: Estética Negra em sua proposta. O projetonasceu de uma demanda surgida em meio a amostra da exposição do ensaio fotográfico “A Beleza de Nossos Corpos Negros”, no 13º Fórum Internacional AWID 2016, “Futuros Feministas: Construindo Poder Coletivo em prol de Direitos e Justiça”. Foi durante as performances que eu realizava no local da amostra da exposição, que conheci a liderança Ernestina Ochoa,que é a presidenta da Asociación de Mujeres Negras Trabajadoras del Peru(AMUNETRAP) e vice-presidenta da Federación Internacional delTrabajadoresdelHogar (FITH), hoje uma amiga.
Trarei algumas situações, relatos e reflexões que envolveram nossos projetos e nosso empenho constante em contribuir para sanar como podemos, partes de uma problemática global estrutural e histórica, complexa atual que nos parece ser intocável e tem sido muito difícil de ser tratada, mas temos alguns avanços: a do falso ideal de raça junto a opressão de gênero com seus efeitos. Estas que se associam a outras ideologias e sistemas de dominação, exploração, privilégio, opressões, como o patriarcado e machismo, o fundamentalismo, o capitalismo, o racismo, o classimo e a exploração, o capacitismo, as lesbo-trans-homofobias violam direitos humanos, porém por serem estruturadas nas sociedades, foram naturalizadas pelas culturas que as amparam, também construídas. Estas violações vem sendo combatidas, principalmente pelos grupos atingidos pela intersecção destas violências produzidas, onde temos conquistas muito lentas e nós mulheres negras temos sido miradas sem descanso de maneira violenta em diferentes países do mundo.
Vivemos um tempo que querer assegurada a igualdade de direitos, ensinar e conscientizar sobre questões de gênero e raça tem custado a vida de muitas mulheres, principalmente as marginalizadas históricamente, como a de suas filhas e filhos, a ruína ou o prejuízo de nossas famílias, entes e amigas\os.
Em realidade, acredito, somos dominadas/os por um pequeno número de homens dominadores alienados, mergulhados principalmente em seus interesses específicos do mundo capitalista, que vem tornando a vida planetária insustentável pelo desejo de poder e riqueza, que favorece pequenos grupos (famílias, entes, relações estreitas), que tem sido pensados por outros homens, também dominados e controlados por homens. Estes que em uma maioria são homens brancos das elites, que tem cultivando a manutenção da ideia desta dominação como natural e positiva. Desse modo de maneira simples, vemos estes pequenos números de homens das elites ( de diversas áreas) vistos como bem sucedidos, que desejam, ditam, impõe suas ideais para outros homens com menos poder (que querem poder) e para as coletividade, que acabam por absorver suas idéias como algo importante e vão mantendo a engrenagem ativa, para os pequenos grupos de homens, que fazem tudo de maneira controlada para que a estrutura funcione em benefício deles, quase que automática, naturalizada. A naturalização destes sistemas e estruturas que mantêm o poder de homens e homens no poder, que se tornam cada vez mais violentos, dominantes, vem atingindo principalmente, de forma perversa e indiferente, as mulheres de origens africanas e as mulheres de outros povos originários não brancos historicamente marginalizadas e excluídas, por suas origens continentais, raciais e pela constituição de seus corpos. E é neste ponto que atravessam nossas almas em corpos negros, que realizamos nosso trabalho de conscientização, educação, movimentações por direitos e igualdade, lidando com estas formas de opressão, pela desconstruções de estigmas, trato dos trauma, o enfrentamento à violências para que possamos existir em contexto de paz.
Sensibilizada Ernestinapediu que eu realizasse a nossa exposição como aconteceu no Fórum AWID\2016, com as mulheres de sua associação que precisavam ser fortalecidas com urgência. Nos encontramos novamente no aeroporto de Salvador(acredito que não por acaso), onde ela me passou seus contatos e repetiu o quanto nossa conversa lhe havia fortalecido, como estava encanta com a exposição e com meu trabalho.
Vi a proposta como algo especial que me agradou muito. Certamente pela afinidade e a oportunidade que a KurimaBantu Mulheres Mudempudiro, eu e a companheira teríamos, como por ser uma proposta desafiadora, pois não tínhamos recursos e nenhuma perspectiva de onde consegui-los.Comecei a pensar na proposta de elaborar um projeto especifico para elas e irmos, então, aplicá-la no Peru.
Durante nossa conversa no Fórum, companheira Ernestina em meio a amostra da exposição, me relatou situações de racismo que vinha passando, no cargo de liderança internacional que ocupa, assim como a maneira que ela vinha enfrentando as situações.Observei que ainda que demonstrasse uma consciência negra muito autêntica, contagiante em meio amuita coragem,mostrava um pesar fragilizado pelo cansaço de uma luta praticamente solitária naqueles espaços. Sua busca por direitos e justiça para a categoria e também para trabalhadoras negras era inspiradora, como comovente. Ela relatou sobre a discriminação racial presente no sindicato de seu país, do qual fazia parte. Explicava que,quando existiam cargos, eles não permitiam que mulheres negras os ocupassem; como quando havia deliberações e\ou encaminhamentospor via de documentos da categoria, os grupos étnicos raciais citados eram os das indígenas e andinas, onde categoricamente as mulheres negras eram excluídas, não eram mencionadas nele, como se não existissem ali.
Esta situação foi causando uma insatisfação insustentável e elas não desejavam mais estar neste espaço, ouvindo coisas que não as incluía, elas que em maioria eram trabalhadoras domésticas negras peruanas, o que ocasionou a criação por elas da AMUNETRAP, uma associação aberta para associar a diversidade de profissionais negras afroperuanas.
Uma das pérolas do racismo presente na história da federação aconteceu quando as\os trabalhadoras\es domésticas\os votaram para que a Ernestina fosse sua vice-presidenta, o que por sua competência foi eleita para o posto. Mas muitas vozes ecoaram dizendo que ela não deveria ser a vice-presidenta, pois,ela não era o ideal de pessoa para representar a América Latina, que seria melhor representada por uma mulher indígena. Afirmavam que uma mulher de origens africanas, negra, afroperuana não poderia representar o Continente Sul Americano e não aceitaram e não gostaram. Assim a discriminação pesada e escancarada se configurava, o racismo presente mesmo em categoria que é extremamente discriminada por diversos marcadores sociais. Mas nada foi feito, tanto para o racismo, como para os descontentamentos com o resultado da eleição legítima. A vice-presidenta passou a ser uma mulher negra, afroperuana, como ainda não havia acontecido. Estas são algumas das manifestações de racismo praticadas principalmente por representações Latino Americanas.
No Peru a discriminação racial contra os povos afroperuanos ocorre, segundo as definições do Estudo Especializado sobre PoblaciónAfroperuana, do Ministério de Cultura do Peru (2013),em dois níveis: o simbólico e cotidiano se estabeleceram tratamentos com a gozação, o escárnio e se incorporou nas interações aceitas socialmente, nas relações raciais de forma naturalizada, pela estruturação do racismo, que a determinadas populações são dificultados os acessos a certos recursos e direitos, que pode interseccionar-se a outras práticas discriminatórias e violências envolvendo outros marcadores sociais: de gênero, classe, sexualidade, idade, dentre outros, é o que apontam os estudos e se confirmam com os relatos:
“Nós mulheres negras somos duramente golpeadas por sermos mulheres, por sermos pobres, por sermos trabalhadoras domésticas e por sermos negras.Esta situação atinge nossos filhos, já que eles tem menos oportunidades de ingressarem na universidade (que são pagas), pelos menos motivos econômicos que nos afetam e porque em nosso país (Peru) não são oferecidas oportunidades para nossos filhos, como para nós mesmas porque somos afrodescendentes.” (Ernestina Ochoa, 2017)
“Os negros pensam até o meio dia” – fala racista naturalizada e reproduzida pela a diversidade de pessoas indígenas (etnias e miscigenados quase brancos e que se consideram brancos), brancos e outros não indígenas, onde valores da branquitude estão muito presentes como positivos. A fala mais chocante e que muito foi relata por diferentes pessoas afroperuanas de várias idades, com muito pesar.
Os danos que o racismo científico causou ao classificar, mas, principalmente, ao hierarquizar grupos humanos, em raças humanas superiores e inferiores para unicamente obter vantagens econômicas, poder e privilégios sociais e “espirituais”, plantaram a ilusória superioridade da raça deles que permanece ativa no imaginário coletivo atual, de maneira global. A manutenção da ideia de raça ligada ao privilégio simbólico branco, carrega na raça branca (habilitada para isto pelo racismo cientifico) o poder para explorar e excluir outros grupos humanos nos tempos coloniais, o que não se extinguiu – ainda que não existam oficialmente, já que vigoram no pensamento coletivo e em suas praticas – até os dias atuais, podendo assim os estigmatizar, como os exterminar, como faz com as populações negras do mundo, principalmente promovendo o genocídio da juventude negra, caso ostensivo no Brasil.
“ …hierarquização das chamadas raças em superiores e inferiores. Carl Von Linné, o Lineu, o mesmo naturalista sueco que fez a primeira classificação racial das plantas, oferece também no século XVIII, o melhor exemplo da classificação racial humana acompanhada de uma escala de valores que sugere a hierarquização.Com efeito, na sua classificação da diversidade humana, Lineu divide o Homo Sapiens em quatro raças: Americano, que o próprio classificador descreve como moreno, colérico, cabeçudo, amante da liberdade, governado pelo hábito, tem corpo pintado. , que o próprio classificador descreve como moreno, colérico, cabeçudo, amante da liberdade, governado pelo hábito, tem corpo pintado. · Asiático: amarelo, melancólico, governado pela opinião e pelos preconceitos, usa roupas largas.amarelo, melancólico, governado pela opinião e pelos preconceitos, usa roupas largas. – Que o próprio classificador descreve como moreno, colérico, cabeçudo, amante da liberdade, governado pelo hábito, tem corpo pintado. amarelo, melancólico, governado pela opinião e pelos preconceitos, usa roupas largas. Africano: negro, flegmático, astucioso, preguiçoso, negligente, governado pela vontade de seus chefes(despotismo), unta o corpo com óleo ou gordura, sua mulher tem vulva pendente e quando amamenta seus seios se tornam moles e alongados.negro, flegmático, astucioso, preguiçoso, negligente, governado pela vontade de seus chefes(despotismo), unta o corpo com óleo ou gordura, sua mulher tem vulva pendente e quando amamenta seus seios se tornam moles e alongados. – Negro, flegmático, astucioso, preguiçoso, negligente, governado pela vontade de seus chefes(despotismo), unta o corpo com óleo ou gordura, sua mulher tem vulva pendente e quando amamenta seus seios se tornam moles e alongados.· Europeu: branco, sangüíneo, musculoso, engenhoso, inventivo, governado pelas leis, usa roupas apertados.branco, sangüíneo, musculoso, engenhoso, inventivo, governado pelas leis, usa roupas apertados. Como Lineu conseguiu relacionar a cor da pele com a inteligência, a cultura e as características psicológicas num esquema sem dúvida hierarquizante, construindo uma escala de valores nitidamente tendenciosa? O pior é que os elementos dessa hierarquização sobreviveram ao tempo a aos progressos da ciência e se mantêm ainda intactos no imaginário coletivo das novas gerações”. (MUNANGA,2016)
O conceito de raça criado e incorporado a seres humanos pelo cientista francês Lineu, no século XVIII, bem como aceito por outros cientistas, intelectuais, autoridades da época ( reis, clero, etc), é um conceito decaído, invalidado pouco tempo depois de ser lançado, por ser estúpido, tendencioso e inteiramente ridículas suas definições de superioridade. Foi criado para legitimação ações de dominação dos europeus em relação a outros povos, principalmente para legitimar a escravização e exploração humana de pessoas africanas, como para as sádicas e perversas atrozes torturas serem feitas sem culpas religiosas. O que com a alegação da não humanidade dada a pessoas africanas pela igreja, legitimava o “motivo” dos ultraje da época que se estende em conseqüências e feitos até os dias atuais. Algo que fora atribuído por pessoas com autoridade religiosa contraditórias e incompatíveis com as descrições do sagrado a que se diziam representantes, como totalmente contraditórias em ações ao “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Preceito enterrado por eles e o mais importante do cristianismo, que foi transmitido por seu próprio anunciador Jesus Cristo, a quem estas pessoas se diziam representantes, tal qual vimos seus estragos feitos pela Santa Inquisição tempos antes, ainda presentes no período colonial. Assim, legitimaram o tráfico de pessoas unido a perversas torturas, inicialmente para resolver questões econômicas, depois para o acumulo de riquezas e com isto, se construía ali um privilégio da raça branca por esta pessoas alienadas. Privilégio da raça branca dada a ela, por ela mesma para ela, para poder dominar, explorar, torturar. Privilégio que lesou, matou, roubou, gerou muitas outras violações e continuam fazendo ainda tudo isto e causando danos nas sociedades contemporâneas, por meio de um problema que agora envolve o psicológico das populações brancas, que as afeta consciente e inconscientemente e precisa ser tratado, por lesar outros grupos raciais (Kilomba, 2014). O privilégio simbólico de raça precisa acabar.
O racismo é a ideologia do irracional (FANON, 2008). É um problema global sim, que faz sociedades crescerem com o racismo, por isto o sistema capitalista também gosta e se beneficia com o racismo, pois ele faz as sociedades crescerem economicamente pela exploração e exclusão de grupos marginalizados, que não participam e nem tem gozo digno da economia das sociedades em que vivem. Nesta estrutura mulheres negras estão na base econômica e muito excluídas em várias partes no mundo.
Como se não bastasse as incontáveis violências vindas das prática racista, a recusa e a negação existem ostensivas da existência do racismo e estas experiências são traumáticas. Grada Kilomba, – no primeiro capítulo, “A Máscara”, do seu livro Plantação de Memórias,traduzido por Jessica Oliveira Jesus[6]– , explicita, que em situações como esta a derecusa em reconhecer a verdade, em se responsabilizar por seus atos, funciona como um “mecanismo de defesa do ego do opera de forma inconsciente para resolver conflitos” . Tal qual define tão bem a autora:“No racismo, a recusa é usada para manter e legitimar estruturas violentas de exclusão racial: Eles\as querem tomar o que é Nosso, por isto têm de ser excluídos\as.”
O fato é que oficializei as parcerias, escrevi o projeto Intercâmbio Brasil/Peru de Mulheres Negras: Empoderamento como Ferramenta de Desenvolvimento, Igualdade e Justiçae submeti o projeto. Fomos um dos 20 projetos selecionados, entre mais de 200 projetos de entidades feministas de 120 países, pelo edital Fondos Semillas (2016) da AssociationWoman’sRight Development (AWID), do qual sou a proponente responsável, coordenadora geral e professora ministrante. O projeto teve sua realização durante ano de 2017 e 2018, atuei como representante da entidade Kurima Bantu Mulheres Mudempodiro em parceria coma a AMUNETRAP, onde a amiga Ernestina Ochoa atuou como a facilitadora e articuladora , nosso querido Léo Rosa Diretor de Arte Gráfica do Coletivo Kurima que tem sido nosso dedicado designer gráfico, que fez um belo, paciente e ágil no trabalho; nossa querida colaboradora Christy Beatriz NajarroGusmán, foi nossa dedicada tradutora de espanhol que fez um trabalho muito delicado e respeitoso com os textos e oficinas que elaborei e lhes confiei. Nossa querida Kellyn Gusmán que fez a captação das imagens com muito engajamento e parceria durante a maior parte das oficinas em Lima.
Formamos equipes maravilhosa de trabalho nos dois países, que me rendo em agradecimentos pela colaboração e que certamente sem elas não conseguiríamos obter os resultados satisfatórios e exitosos que tivemos, assim com as outras parcerias que firmamos. Tivemos o significativo e generoso apoio-patrocínio internacional da AWID; o comprometido e importante apoio da UFSC, por meio do Gabinete do Reitor, do Curso de Artes Cênicas, do CFH, do CSE, Municipalidad de Chorrillos,Centro de Desarrollo de La Mujer Negra Peruana (CEDEMUNEP), dentre outros apoiadores que tornaram possível a viabilidade deste relevante projeto de empoderamento para mulheres negras.
Assim iniciamos o intercâmbioem julho de 2017. Ministrei um ciclo de oficinas, para as mulheres afroperuanas da AMUNETRAP, nos meses de julho e agosto, em Lima, com excelente participação do público. A primeira oficina ocorreu no evento em alusão ao Dia 25 de Julho, Dia da Mulher Afrolatina e Afro Caribenha (ou Dia da Mulher Negra no Brasil) , no“2º Encontro de Mulheres Afrochorrillanas”, com as mulheres da AMUNETRAP, Chorrilleñas, suas famílias e a comunidade. Iniciamos nossa circulação pela América Latina doIntercâmbio Brasil/Peru de Mulheres Negras: Empoderamento como Ferramenta de Desenvolvimento, Igualdade e Justiçacomeçando pelo Lima (Peru) e seguimos para Salvador (Brasil), em dezembro do mesmo após nova pré-produção cheia de novos ajustes e importantes incorporações no projeto, que nos possibilitaram contribuir em processos de organizações e mudanças das trabalhadoras afrolatinas. A etapa Brasil, aconteceu em parceria com o 1º Encontro de trabalhadoras Domésticas Afrolatinas, no Hotel Bahia Mar, em Salvador, Estado da Bahia, no Brasil e se configurou em uma ação de maior envergadura de nível Latino Americano. Aconteceu de 01 à 03 de dezembro de 2017. Nele eu, Roberta Lira, ofereci a oficina “ Consciência Negra das Mulheres Afros: uma chave para as transformações sociais e seus direitos no trabalho doméstico”, específica para o empoderamento de mulheres negras, que desenvolvi especialmente para o encontro. A companheira Ernestina Ochoa enquanto vice-presidenta da Federación Internacional de Trabajadores Del Hogar participou da mesa de abertura e damesas :Construindo Políticas de Igualdade Racial dentro do Movimento Sindical.A dimensão dos Osresultados materializados das instrumentalizações personalizadas de empoderamento a vice-presidenta da FITH culminaram em nossa contribuição em importante processo de organização sindical das trabalhadoras domésticas afrolatinas, pela consciência negra e conscientização de não negras em nível internacional, que gerou o 1º Encontro de Trabalhadoras Domésticas Afrolatinas Ernestina com a temática racial, uma conquista vitoriosa, visto que as mulheres, exceto Ernestina e as lideranças brasileiras, não localizavam o racismo como uma das maiores formas de exclusão delas, no trabalhista e na categoria sindical.
Atuei mais amplamente com as realidades de mulheres negras de outros países; trabalhando com a exposição no exterior, com um delicado trabalho de harmonização cultural e identificação de grupo, estética, de sensibilização ancestral que culminava na auto-aceitação das mulheres negras por meio de suas afirmações estéticas, visto que suas existências de almas com em corpos negros são diretamente afetadas e por isto este trabalho tem sido de suma importância no processo de libertação existencial de tantos traumas, pela humanização de si mesmas, de seus corpos estigmatizados, para empoderando-se, se potencializarem, tendo mais amor por seus corpos, por si mesmas e, por suas vidas e consequentemente para conseguirem ter maior autonomia.
O Brasil, o Peru, como todos os países do mundo precisam valorizar e amar sua matriz fundante, tão negada, nossa terra originária, a mãe África,a fim de que trilhemos novos caminhos e possamos reconhecer, reconstruir, reconectar e transformar nossas histórias, para que nossas sociedades transcendam e se reumanizem nas relações entre pessoas, entre povos e na relação com o nosso planeta que nos abriga, tanto nos dá e possibilita a vida.
Quando ampliamos nossa consciência sentimos que vamos avançando. Ainda que para obtermos conquistas, mesmo de direitos que dizem nos ser garantidos, em muitos casos quase tudo implica em muitas ações, engajamento e comprometimento.
[1] KurimaBantu Mulheres Mudemporiro – Mulheres em Desenvolvimento por Direitos para Ombembwá(Paz): KurimaBantu Mulheres MUDEMPORIRO – Mulheres em Movimento e Desenvolvimento por Direitos para Ombembwá (Paz) – Movimento de mulheres de origem africana, negras empoderadas ou que estão conquistando empoderamento, que se reúnem para ajudarem na construção de bem estar material e espiritual. A igualdade de gênero e raça é seu maior objetivo: elas lutam por uma sociedade livre de racismo e machismo. Para tanto, se esforçam por preservar suas culturas e identidades e alcançar melhores condições de vida.
[2] Coletivo Kurima – Estudantes Negras e Negros da UFSC – O Coletivo Kurima foi criado em 2011, por uma maioria de estudantes negras e negros da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Kurima se distingue e identifica pelo protagonismo negro. Onde as cenas das questões negras são pautas significativas, com espaço para todas as que se façam necessárias. É uma entidade independente[…]”
[3] Espaços Brancos – O racismo ao definir clivagens sociais e uma hierarquização do indivíduos e grupos por suas pertenças raciais, se expressa na constituição de “lugares“(nos sentidos espacial e social) onde a presença dos desfavorecidos será majoritária (lugares da pobreza, da subalternidade) e lugares onde sua presença é minoritária (lugares de riqueza, do poder, do saber socialmente legitimado) (Santos, 2007). As atribuições subjetivas são influenciadas por princípios valorativos. E na forma prática desta clivagem vemos que pelas hierarquias, quem “pode” estar em cada um destes lugares conformados pelo racismo
[4]Exposição “Ensaio Fotográfico: A Beleza de Nossos Corpos Negros” Ficha Técnica: Concepção, Curadoria e Coordenação Geral: Roberta Lira/ Fotografia: Diana Souza / Design Gráfico: Léo Rosa / Produção: Amanda Duarte, Ricardo Murdock e João Gomes. Realização: KurimaBantu Mulheres Mudempodiro e Coletivo Kurima – Estudantes Negras e Negros da UFSC. Facebook: Coletivo Kurima, DossieKurima / Contato: (48) 99914.2493
[5] Expressão utilizada por uma das criadoras do Coletivo Kurima, psicóloga Renata Christiane A. de Lima, Bacharela e Licenciada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e mestranda do Programa de Psicologia Social e Cultural da UFSC.
[6] A tradução do primeiro capítulo do livro Plantação de Memórias, “A Máscara”, da escritora, teórica, psicóloga e performer Grada Kilomba, foi traduzido por Jessica Oliveira de Jesus, que é Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução(PGET), pela Universidade Federal de Santa Catarina e pesquisa literatura afrodiaspórica de língua alemã. Graduada em Letras Português\Alemã, pela Universidade Estadual de São Paulo (USP).
* Cantora, atriz, performer, produtora cultural, curadora, professora de cantos e musicalização infantil, pesquisadora de arte e cultura de matriz africana, bacharela em Artes Cênicas e mestranda do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução da UFSC . Diretora Executiva do KurimaBantu Mulheres Mudempodiro, Diretora de Projetos, Arte e Cultura do Coletivo Kurima – Estudantes Negras/os da UFSC. Diretora Vozes de Zambi – projeto de extensão e coletivo (UFSC), Intercâmbio Brasil/Peru de Mulheres Negras: Empoderamento como Ferramenta de Desenvolvimento, Igualdade e Justiça e membro da Association for Women’sRights in Development (AWID).