O Pós-Dramático – Agnaldo Stein

O Pós-Dramático

 

Agnaldo Stein*

"Einstein on the Beach", Philip Glass e Bob Wilosn

“Einstein on the Beach”, Philip Glass e Bob Wilosn

 https://www.youtube.com/watch?v=kDmfNsSI1ao 

O livro O pós-dramático: um conceito operativo?, organizado por J. Guinsburg e Silvia Fernandes, publicado pela editora Perspectiva, reúne ensaios de teóricos do teatro brasileiro que abordam a temática-título, cujo impacto no Brasil e no mundo é notória. O livro também traz um texto de Hans-Thies Lehmann, crítico e professor alemão que conceituou a definição de teatro pós-dramático. Teatro pós-dramático e teatro político trata-se de uma síntese do depoimento do autor durante Seminário Internacional feito em setembro de 2003, no Instituto Goethe de São Paulo, por meio do Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas da eca/usp, com tradução de Rachel Imanishi.

Para Lehmann, o drama tradicional pressupõe que a relação entre as pessoas seja essencial para o entendimento da realidade. Há um conflito cuja progressão culminará em uma síntese, ou seja, a presença do processo dialético. Constitui-se essa forma tradicional de teatro a partir da unidade entre elementos, como pessoas, espaço e tempo. Com a modernidade, cada um desses elementos ganha autonomia. O tempo, por exemplo. No drama tradicional, sustentado pela unidade de tempo aristotélica, o espectador esquece-se do tempo envolvendo-se na trama. No teatro moderno, os autores colocam o tempo como temática, tornando o tempo de um trabalho artístico extremamente lento, acelerado ou mesmo descontínuo. Por isso, o pós-dramático não vem para destruir o teatro, mas pode se servir de elementos tradicionais deste de outro modo.

O pós-dramático não se satisfaz em simplesmente contar uma história, mas em interromper o modo piloto-automático corrente na sociedade e, por meio desse break, provocar a reflexão sobre esse modus vivendi social. Outros elementos também o diferem do fazer clássico teatral. O público, neste contexto, tem mais autonomia e proximidade com os artistas, tornando-se também um integrante do processo. O corpo, inexistente no drama tradicional, ganha importância no teatro pós-dramático, e isso não quer dizer que não pode haver texto.

Para elucidar, Lehmann cita o exemplo de Gertrude Stein, o que chamar de dramaturgia, segundo ele, é mesmo questionável, pois ela escrevia o que denominava de “peça-paisagem”, ou seja, uma peça escrita para ser observada como se fosse uma paisagem. E como em uma paisagem, isenta de hierarquia, onde a árvore é tão importante quanto a pedra. Desamarrava-se Stein de um teatro pautado na dinâmica da história e do personagem, e suas peças-paisagem elucidam o teatro pós-dramático, ainda que ela não as chamasse assim.

Como exemplo, temos a peça Vozes de Mulheres, parte do volume Geography and Plays, originalmente publicada em 1922, com tradução em português de Júlio Castañon Guimarães. A peça inicia com um bloco inominado e depois temos segundo, terceiro e quarto atos, este contendo a cena II. Nomes de personagens são citados, às vezes parece que lemos indicações de cena entre diálogos, mas tudo se mistura. Por vezes, incluímos uma pontuação que nos faça encontrar sentido no que lemos, mas a intenção do texto parece a adesão ao nonsense.

 

*Aluno do Curso de Artes Cênicas da UFSC