Horacio Quiroga e o “Manual del perfecto cuentista” – Willian Henrique Cândido Moura

Horacio Quiroga e o “Manual del perfecto cuentista”

Horacio Quiroga and the “Manual del perfecto cuentista”

Willian Henrique Cândido Moura

Universidade Federal de Santa Catarina[1]

Horacio Quiroga

Horacio Quiroga (1879-1937) foi um escritor uruguaio que passou a maior parte de sua vida na selva de Misiones, Argentina. Sua trajetória sempre esteve rodeada pela morte e por tragédias: seu pai morreu em um acidente de caça, seu padrasto e sua primeira esposa se suicidaram, matou um amigo com um tiro de revólver acidentalmente, foi diagnosticado com câncer, o que o levou ao suicídio ingerindo uma dose mortífera de cianeto. Devido a todos esses trágicos acontecimentos, a morte passou a ser o tema central de suas obras, sendo “Cuentos de amor, de locura y de muerte” de 1917, sua primeira grande obra publicada. (Academia Nacional de Letras, 2016).

Apesar de todos esses desastres em sua vida, Quiroga foi um dos primeiros escritores profissionais, ou seja, que tentou viver da escrita e que possuía uma consciência clara a respeito de sua profissão, tendo em mente que escrever, assim como qualquer outro trabalho, deve ser melhorado e aperfeiçoado a cada dia. Um exemplo disso é o texto aqui traduzido, intitulado “Manual del perfecto contista”, publicado em 1925.

“Manual del perfecto contista” faz parte dos textos de teoria literária escritos pelo autor. A partir de sugestões de pessoas interessadas na escrita de contos, Quiroga apresenta alguns truques para escrever narrativas curtas, fazendo com que os escritores reflitam sobre esse ofício. O texto foi traduzido a fim de divulgar a obra de teoria do conto escrita por Horacio Quiroga no início do século XX, obra que não ganhou tanta divulgação e reconhecimento quanto sua obra literária.

Manual do contista perfeito – Horacio Quiroga (1925)

Tradução de Willian Henrique Cândido Moura

 

Um grande número de pessoas entre nós dedicadas a escrever contos, e alguma experiência pessoal a respeito, sugeriram-me, mais de uma vez, a indagação de se não há, na arte de escrever contos, alguns truques de trabalho, algumas receitas de uso cômodo e de efeito seguro, e se esses não poderiam ser formulados como passatempo para as muitas pessoas cujas ocupações sérias não lhes permitem aperfeiçoar-se em uma profissão geralmente mal retribuída e nem sempre bem-vista.

Esse grande número de contistas, ter sido confidente de suas lutas, os comentários escutados, inquietudes e desesperanças, trouxeram-me convicção de que, salvo algumas exceções em que um conto sai bem sem nenhum recurso, todos os demais sempre são realizados por meio de receitas e truques de procedimentos ao alcance de todos, desde que, conheçam sua posição e seu fim.

Vários amigos me encorajaram a realizar esse trabalho, que poderíamos chamar de divulgação literária, se literário não fosse um termo muito avançado para uma anagnosia fundamental.

Pois um dia farei essa obra altruísta, por qualquer um de seus lados, e piedosa, a partir de outros pontos de vista.

Hoje apontarei alguns dos truques que me parecem estar mais à luz dos olhos. Tivesse sido meu desejo citar os contos nacionais cujos parágrafos apresento mais à frente. Outra vez será. Por hora nos contentamos em expor três ou quatro receitas das mais usuais e seguras, convencidos de que elas facilitarão a prática cômoda e caseira do que se veio a chamar de o mais difícil dos gêneros literários.

Começaremos pelo final. Convenci-me de que, do mesmo modo que em um soneto, o conto começa pelo final. Nada no mundo pareceria mais fácil que encontrar a frase final para uma história, que, precisamente, acaba de ser concluída. No entanto, nada é mais difícil.

Uma vez encontrei um amigo meu, um excelente contista, chorando, de cotovelos sobre um conto que não podia terminar. Faltava-lhe só a frase final, mas não a via. Soluçava, e mesmo assim, ainda não via.

Observei que o choro geralmente serve para viver o conto na literatura, ao modo russo; mas não para escrevê-lo. Poderia garantir, de olhos fechados, que toda história que faz seu autor soluçar ao escrevê-la, admite matematicamente esta frase final:

“Estava morta!”

Por seu autor não recordá-la a tempo, vimos fracassar mais de um conto de grande força. O artista muito sensível deve ter sempre prontos, como lágrimas na ponta de seu lápis, os admirativos.

As frases curtas são indispensáveis para finalizar os contos de emoção recôndita ou contida. Uma delas é:

“Nunca voltaram a se ver”.

Pode ser mais contida ainda:

“Somente ela virou o rosto”.

E quando a amargura e um certo desdém superior prevalecem no autor, cabe esta simples frase:

“E assim continuaram vivendo”.

Outra frase de espírito semelhante à anterior, mesmo que mais truncada em estilo:

“Foi o que fizeram”.

E por fim esta, que por demonstrar grande domínio de si e uma suficiência irônica no gênero, não recomendaria aos principiantes:

“O conto termina aqui. O resto, apenas interessa aos personagens”.

Não obstante, existe um truque para finalizar um conto, que não é precisamente final, sempre de grande impacto e muito útil aos prosistas que escrevem também em verso. É este o termo truque do “leitmotiv”.

Final: “Lá longe, atrás do negro páramo calcinado, o fogo apagava suas últimas chamas…”

Começo do conto: “Silvando entre as palhas, o fogo invadia o campo levantando grandes chamas. A criatura dormia…”

Das minhas tantas e prolixas observações, deduzi que o começo do conto não é, como muitos desejam crer, uma tarefa fundamental. “Tudo é começar”. Nada mais  certo, mas tem que fazê-lo. Para começar, é necessário, em noventa e nove por cento dos casos, saber aonde se vai. “A primeira palavra de um conto – dizem – deve ser escrita já com vistas ao final”.

De acordo com esse cânone, notei que o começo é grosseiro, como se o leitor já conhecesse parte da história que vamos narrar, proporciona ao conto um vigor insólito. Notei também, que o início com orações complementares favorece amplamente esses começos. Um exemplo: “Como Elena não estava disposta a conceder-lhe, ele, depois de observá-la friamente, foi buscar seu chapéu. Ela, por todos os comentários, entristeceu-se”.

Eu sempre tive a impressão de que um conto que começa assim tem grandes possibilidades de triunfar. Quem era Elena? E ele, como se chamava? O que Elena não concedeu a ele? Que motivos ele tinha para lhe pedir? E por que observou friamente Elena, em vez de fazer furiosamente, como era mais lógico de se esperar?

Veja tudo o que se ignora do conto. Ninguém sabe. Mas a atenção do leitor já foi tomada pela surpresa, e isso constitui um desiderato na arte de contar.

Anotei algumas variantes desse truque das frases secundárias. O começo condicional costuma possuir um ótimo efeito:

“Se tivesse reconhecido ela a tempo, o deputado podia ter ganho uma saudação, e a reeleição. Mas perdeu ambas as coisas”.

À semelhança do exemplo anterior, nada sabemos sobre os personagens que nos são apresentados como conhecidos, nem quem foi a tão influente dama que o deputado não reconheceu. O truque do interesse está, precisamente, nisso.

“Como acabava de chover, a água ainda gotejava pelos cristais. E seguir as linhas com o dedo, foi a maior diversão que havia tido a recém casada desde seu casamento.”

Ninguém supõe que a lua de mel possa se mostrar com tão pouca doçura ao ponto de encontrar seu fim ao longo de um vidro em uma tarde de chuva.

Dessas pequenas diabruras é que se constitui a arte de contar. Há um tempo se obedeceu ao começo do conto em diálogo, a princípio, como um procedimento muito eficaz. Hoje, o mistério do diálogo se desvaneceu do todo. Talvez duas ou três frases agudas se arrastem ainda; mas se passam de quatro, o leitor salta em seguida. “Não cansar”. Tal é, a meu modo de ver, o apotegma inicial do contista perfeito. O tempo é muito curto nesta miserável vida para perdê-lo de um modo mais miserável ainda.

De acordo com minhas impressões, tomadas aqui e acolá, deduzo que o truque mais eficaz (ou eficiente, como se diz na Escola Normal), se encontra no uso de duas velhas fórmulas abandonadas, que os velhos contistas entregaram há um tempo atrás com toda sua boa fé. Elas são:

“Era uma linda noite de primavera” e “Era uma vez…”

Que intriga anunciam esses começos?

Que evocações mais insípidas, à força de ingênuas, que as que despertam essas duas frases simples e calmas? Nada em nosso interior se violenta com elas. Nada prometem, nem nada sugerem a nosso instinto adivinhatório. No entanto, pode-se confiar em seu êxito… se o resto vale. Depois de refletir muito, não encontrei em ambas as receitas mais do que um inconveniente: o de despertar terrivelmente a malícia dos que cultuam o conto. Essa malícia profissional é a mesma com que se ateria o anúncio de um homem que se dispôs a revelar a beleza de uma dama vulgarmente encoberta: “Cuidado! É belíssima!”.

Existe um truque singular, pouco praticado, e, no entanto, cheio de frescuras quando se usa com má fé.

Este truque é o do lugar comum. Ninguém ignora o que é lugar comum na literatura. “Pálido como a morte” e “Dar a mão direita para conseguir algo” são dois bem característicos.

Chamamos lugar comum de boa fé ao que ocorre de modo arrastado inconscientemente pelo mais puro sentimento artístico; essa pureza de arte que nos leva a louvar em verso o encanto das gretas dos ladrilhos dos trilhos da estação da vila de Cucullú, e a impressão sofrida por esses mesmos ladrilhos no dia em que a noiva de nosso amigo, que só conhecíamos de vista, por casualidade os pisou.

Essa é a boa fé. A má fé se reconhece na falta de correlação entre a frase feita e o sentimento ou a circunstância que a inspiram.

Ficar pálido como a morte perante o cadáver da noiva é um lugar comum. Deixa de ser quando ao ver perfeitamente viva a noiva de nosso amigo, empalidecemos até a morte.

“Eu insistia em tirar-lhe o lodo dos sapatos. Ela, rindo, se negava. E, com uma breve saudação, entrou no trem, enlameada até o tornozelo. Era a primeira vez que eu a via; não tinha me seduzido, nem interessado, nem voltei a vê-la. Mas o que ela ignora é que, naquele momento, eu tivesse dado com gosto a mão direita para tirar-lhe o barro dos sapatos.”

É natural e próprio de um homem perder sua mão por um amor, uma vida ou um beijo. Não é tão comum dá-la para ver de perto os sapatos de uma desconhecida. Surpreende a frase fora de sua localização psicológica habitual; e aqui está a má fé.

O tempo é curto. Não são poucos os truques que ficam para examinar. Creio piamente que se acrescentamos aos já estudados, o truque da contraposição de adjetivos, o da cor local, o truque das ciências técnicas, o do estilista sóbrio, o do folclore, e alguns mais que não escapem à malícia dos colegas, em grande medida, todos eles facilitarão a confecção caseira, rápida e sem falhas, de nossos maiores contos nacionais…

 

Manual del perfecto cuentista – Horacio Quiroga (1925)

 

Una larga frecuentación de personas dedicadas entre nosotros a escribir cuentos, y alguna experiencia personal al respecto, me han sugerido más de una vez la sospecha de si no hay, en el arte de escribir cuentos, algunos trucos de oficio, algunas recetas de cómodo uso y efecto seguro, y si no podrían ellos ser formulados para pasatiempo de las muchas personas cuyas ocupaciones serias no les permiten perfeccionarse en una profesión mal retribuida por lo general y no siempre bien vista.

Esta frecuentación de los cuentistas, los comentarios oídos, el haber sido confidente de sus luchas, inquietudes y desesperanzas, han traído a mi ánimo la convicción de que, salvo contadas excepciones en que un cuento sale bien sin recurso alguno, todos los restantes se realizan por medio de recetas o trucos de procedimiento al alcance de todos, siempre, claro está, que se conozcan su ubicación y su fin.

Varios amigos me han alentado a emprender este trabajo, que podríamos llamar de divulgación literaria, si lo de literario no fuera un término muy avanzado para una anagnosia elemental.

Un día, pues, emprenderé esta obra altruista, por cualquiera de sus lados, y piadosa, desde otros puntos de vista.

Hoy apuntaré algunos de los trucos que me han parecido hallarse más a flor de ojo. Hubiera sido mi deseo citar los cuentos nacionales cuyos párrafos extracto más adelante. Otra vez será. Contentémonos por ahora con exponer tres o cuatro recetas de las más usuales y seguras, convencidos de que ellas facilitarán la práctica cómoda y casera de lo que se ha venido a llamar el más difícil de los géneros literarios.

Comenzaremos por el final. Me he convencido de que, del mismo modo que en el soneto, el cuento empieza por el fin. Nada en el mundo parecería más fácil que hallar la frase final para una historia que, precisamente, acaba de concluir. Nada, sin embargo, es más difícil.

Encontré una vez a un amigo mío, excelente cuentista, llorando, de codos sobre un cuento que no podía terminar. Faltábale sólo la frase final. Pero no la veía, sollozaba, sin lograr verla así tampoco.

He observado que el llanto sirve por lo general en literatura para vivir el cuento, al modo ruso; pero no para escribirlo. Podría asegurarse a ojos cerrados que toda historia que hace sollozar a su autor al escribirla, admite matemáticamente esta frase final:

“¡Estaba muerta!”

Por no recordarla a tiempo su autor, hemos visto fracasar más de un cuento de gran fuerza. El artista muy sensible debe tener siempre listos, cómo lágrimas en la punta de su lápiz, los admirativos.

Las frases breves son indispensables para finalizar los cuentos de emoción recóndita o contenida. Una de ellas es:

“Nunca volvieron a verse”.

Puede ser más contenida aun:

“Sólo ella volvió el rostro”.

Y cuando la amargura y un cierto desdén superior priman en el autor, cabe esta sencilla frase:

“Y así continuaron viviendo”.

Otra frase de espíritu semejante a la anterior, aunque más cortante de estilo:

“Fue lo que hicieron”.

Y ésta, por fin, que por demostrar gran dominio de sí e irónica suficiencia en el género, no recomendaría a los principiantes:

“El cuento concluye aquí. Lo demás, apenas si tiene importancia para los personajes”.

Esto no obstante, existe un truco para finalizar un cuento, que no es precisamente final, de gran efecto siempre y muy grato a los prosistas que escriben también en verso. Es este el truco del “leit-motiv”.

Final: “Allá a lo lejos, tras el negro páramo calcinado, el fuego apagaba sus últimas llamas…”

Comienzo del cuento: “Silbando entre las pajas, el fuego invadía el campo, levantando grandes llamaradas. La criatura dormía…”

De mis muchas y prolijas observaciones, he deducido que el comienzo del cuento no es, como muchos desean creerlo, una tarea elemental. “Todo es comenzar”. Nada más cierto, pero hay que hacerlo. Para comenzar se necesita, en el noventa y nueve por ciento de los casos, saber a dónde se va. “La primera palabra de un cuento -se ha dicho- debe ya estar escrita con miras al final”.

De acuerdo con este canon, he notado que el comienzo exabrupto, como si ya el lector conociera parte de la historia que le vamos a narrar, proporciona al cuento insólito vigor. Y he notado asimismo que la iniciación con oraciones complementarias favorece grandemente estos comienzos. Un ejemplo:

“Como Elena no estaba dispuesta a concederlo, él, después de observarla fríamente, fue a coger su sombrero. Ella, por todo comentario, se encogió de hombros”.

Yo tuve siempre la impresión de que un cuento comenzado así tiene grandes posibilidades de triunfar. ¿Quién era Elena? Y él, ¿cómo se llamaba? ¿Qué cosa no le concedió Elena? ¿Qué motivos tenía él para pedírselo? ¿Y por qué observó fríamente a Elena, en vez de hacerlo furiosamente, como era lógico de esperar?

Véase todo lo que del cuento se ignora. Nadie lo sabe. Pero la atención del lector ya ha sido cogida por sorpresa, y esto constituye un desiderátum, en el arte de contar.

He anotado algunas variantes a este truco de las frases secundarias. De óptimo efecto suele ser el comienzo condicional:

“De haberla reconocido a tiempo, el diputado hubiera ganado un saludo, y la reelección. Pero perdió ambas cosas”.

A semejanza del ejemplo anterior, nada sabemos de estos personajes presentados como ya conocidos nuestros, ni de quién fuera tan influyente dama a quien el diputado no reconoció. El truco del interés está, precisamente, en ello.

“Como acababa de llover, el agua goteaba aún por los cristales. Y el seguir las líneas con el dedo fue la diversión mayor que desde su matrimonio hubiera tenido la recién casada”.

Nadie supone que la luna de miel pueda mostrarse tan parca de dulzura al punto de hallarla por fin a lo largo de un vidrio en una tarde de lluvia.

De estas pequeñas diabluras está constituido el arte de contar. En un tiempo se acudió a menudo, como a un procedimiento eficacísimo, al comienzo del cuento en diálogo. Hoy el misterio del diálogo se ha desvanecido del todo. Tal vez dos o tres frases agudas arrastren todavía; pero si pasan de cuatro el lector salta en seguida. “No cansar”. Tal es, a mi modo de ver, el apotegma inicial del perfecto cuentista. El tiempo es demasiado breve en esta miserable vida para perdérselo de un modo más miserable aún.

De acuerdo con mis impresiones tomadas aquí y allá, deduzco que el truco más eficaz (o eficiente, como se dice en la Escuela Normal), se lo halla en el uso de dos viejas fórmulas abandonadas, y a las que en un tiempo, sin embargo, se entregaron con toda su buena fe los viejos cuentistas. Ellas son:

“Era una hermosa noche de primavera” y “Había una vez…”

¿Qué intriga nos anuncian estos comienzos?

¿Qué evocaciones más insípidas, a fuerza de ingenuas, que las que despiertan estas dos sencillas y calmas frases? Nada en nuestro interior se violenta con ellas. Nada prometen ni nada sugieren a nuestro instinto adivinatorio. Puédese, sin embargo, confiar en su éxito… si el resto vale. Después de meditarlo mucho, no he hallado a ambas recetas más que un inconveniente: el de despertar terriblemente la malicia de los cultores del cuento. Esta malicia profesional es la misma con que se acogería el anuncio de un hombre al que se dispusiera a revelar la belleza de una dama vulgarmente encubierta: “¡Cuidado! ¡Es hermosísima!”.

Existe un truco singular, poco practicado, y, sin embargo, lleno de frescura cuando se lo usa con mala fe.

Este truco es el del lugar común. Nadie ignora lo que es en literatura el lugar común. “Pálido como la muerte” y “Dar la mano derecha por obtener algo” son dos bien característicos.

Llamamos lugar común de buena fe al que se comete arrastrado inconscientemente por el más puro sentimiento artístico; esta pureza de arte que nos lleva a loar en verso el encanto de las grietas de los ladrillos del andén de la estación del pueblecito de Cucullú, y la impresión sufrida por estos mismos ladrillos el día que la novia de nuestro amigo, a la que sólo conocíamos de vista, por casualidad los pisó.

Esta es la buena fe. La mala fe se reconoce en la falta de correlación entre la frase hecha y el sentimiento o circunstancia que la inspiran.

Ponerse pálido como la muerte ante el cadáver de la novia es un lugar común. Deja de serlo cuando al ver perfectamente viva a la novia de nuestro amigo, palidecemos hasta la muerte.

“Yo insistía en quitarle el lodo de los zapatos. Ella, riendo, se negaba. Y, con un breve saludo, saltó al tren, enfangada hasta el tobillo. Era la primera vez que yo la veía; no me había seducido, ni interesado, ni he vuelto más a verla. Pero lo que ella ignora es que, en aquel momento, yo hubiera dado con gusto la mano derecha por quitarle el barro de los zapatos”.

Es natural y propio de un varón perder su mano por un amor, una vida o un beso. No lo es ya tanto darla por ver de cerca los zapatos de una desconocida. Sorprende la frase fuera de su ubicación psicológica habitual; y aquí está la mala fe.

El tiempo es breve. No son pocos los trucos que quedan por examinar. Creo firmemente que si añadimos a los ya estudiados el truco de la contraposición de adjetivos, el del color local, el truco de las ciencias técnicas, el del estilista sobrio, el del folklore, y algunos más que no escapan a la malicia de los colegas, facilitarán todos ellos en gran medida la confección casera, rápida y sin fallas, de nuestros mejores cuentos nacionales…

Referências:

 

Academia Nacional de Letras – ANL. Horacio Quiroga. Montevideo. Disponível em: <http://www.academiadeletras.gub.uy/innovaportal/v/73759/46/mecweb/horacio-quiroga?contid=73739> 2016. Acesso em: 09 nov. 2018.

QUIROGA, Horacio. Manual del perfecto contista. In: Teorías del cuento: Teorías de los cuentistas. Universidad Nacional Autónoma de México. v. 1. 1995. ISBN 968-36-2331-X. p. 31-36. Disponível em: <http://www.ingenieria.unam.mx/dcsyhfi/material_didactico/Literatura_Hispanoamericana_Contemporanea/Autores_Q/QUIROGA/Manual.pdf:. Acesso em 10 out. 2018.

[1] Mestrando do Programa de Pós-graduação em Estudos da Tradução (PGET/UFSC). Bolsista do CNPq. E-mail: willianhenry_@hotmail.com. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, Brasil.