Poemas de Duda Machado
Florianópolis, 21 de novembro de 2011.
Poemas
Por Duda Machado*
Como anotações repetidas num diário
Não há mais nada para ser adiado.
No ar coberto pelo pó, a memória
esbarra nos rastros do que pôde ser
vivido como revelação e início.
O espelho que aguarda,
o mar de antes,
a miséria tão
certa como a esquina,
o que os corvos sabem (?).
Dentro da falha que persiste,
a persistência em querer ver.
A surpresa ante o próprio
entusiasmo repentino.
E a escuridão – desejada
feito música.
(Adivinhação da Leveza. Editora Azouge, 2011)
Transformação da memória
Híbrida de quantas se foram
confundindo na recordação,
a chuva sobre o mar imprimia
um diagrama vivo, trêmulo,
a alternar peso e ritmo até que, se
destacando das ondas, a pedra arrebata
a vista, como se sua cor mais escura,
na qual alcança se envolver em solidez,
avançasse sobre o branco-verde embaçado
das águas, obstinada, ríspida, contrária.
(Adivinhação da Leveza. Editora Azouge, 2011)
Objetos, ocasiões
objetos, ocasiões,
pele, pétalas,
de que só certas sílabas
sabem a trama ou o toque
o arco que vai da criança
que deixa o brinquedo
de lado ao adulto insone
através da madrugada
o leve intervalo que entre
este e aquele instrumento
faz a sonoridade
mais densa
(Adivinhação da Leveza. Editora Azouge, 2011)
Rasante
O dia que agora inicia sua fuga,
pode ser longo ou breve.
E seja como for, diverso
do que seria a natureza
do ritmo de seu curso.
Entretanto – rasante-,
desce sobre o corpo
o tempo ainda por vir.
Reminiscência
As sombras descem ao
encontro do que
está para acontecer.
Da vida que tiveram antes,
vão guardar apenas uns
restos de silêncio e de repouso.
* Duda Machado é poeta, professor de literatura e tradutor.