Poesia, ironia e resistência. Wisława Szymborska olha para o totalitarismo – Piotr Kilanowski

Poesia, ironia e resistência. Wisława Szymborska  olha para o totalitarismo.[1]

 

Piotr Kilanowski [2]

Wisława Szymborska

Wisława Szymborska

O tema deste texto é a ironia, seu papel no fazer da poesia e seu sentido de resistência. Na primeira parte, partindo do pensamento de Stanisław Barańczak (1946-2014), estudioso, poeta e ativista da oposição na Polônia comunista, a respeito da poesia no mundo de hoje, teço reflexões que estabelecem uma espécie de paralelo entre o fazer poético e o fazer do ironista, tanto na sua construção quanto na sua função diante do mundo e da linguagem. Partindo destes pressupostos, na segunda parte, aplico esta reflexão trazendo análises de alguns poemas da autora polonesa Wisława Szymborska, baseadas em interpretações de Tadeusz Nyczek, crítico literário polonês.

Stanisław Barańczak, poeta, ensaísta e tradutor polonês, em seu ensaio Mudada voz de Settembrini[3] mostra que a briga entre Settembrini e Naphta em A montanha mágica de Thomas Mann pode ser vista como o ponto de partida para a compreensão do século que se iniciava, quando foi escrito o romance. O ensaísta tenta traduzir a querela dos dois protagonistas como a discussão entre humanismo e dogmatismo, arte e política e, porque não, entre poesia e teoria doutrinária.

A voz do poeta humanista, do Settembrini dos tempos de hoje, embora continue tão desamparada quanto na discussão com Naphta, certamente está menos segura de si mesma após as experiências que aconteceram depois de A montanha mágica. Não é possível ao Settembrini de hoje, afirma Barańczak, cegamente acreditar na razão, na análise, no progresso, no amanhã luminoso e na bondade natural do ser humano. A história, provocada pela aplicação dos dogmatismos de Naphta, acabou fornecendo-lhe novos argumentos a respeito dos problemas do ser humano. Em vez de tentar encontrar a liberdade e procurar a verdade própria, a maioria se contenta em seguir as autoridades e ser obediente a vários Naphtas.

A arte sempre perde na rivalidade com as doutrinas, embora involuntariamente seja ela quem dê a estas a base de seus substratos – a utopia. As doutrinas servem versões das utopias cada vez mais atraentes, consumíveis ou salvadoras. O papel da arte para Barańczak nesta situação consiste, entre outros, em mostrar o caminho espinhoso e eticamente complicado para suas realizações. Em vez de se contentar em construir as versões do mundo ordenadas, distantes da realidade e simpáticas, a arte precisa mostrar seus conflitos e paradoxos. Graças à vivência do século XX, a arte aprendeu a mostrar o preço da realização dos sonhos utópicos, que é superfaturado.

Por isso a poesia do século XX duvida. E suas dúvidas são uma forma de defesa dos valores. Enquanto isso, a doutrina se assoberba quando entram em voga os valores. Não importa que os mesmos serão rejeitados com desprezo no mundo pós-eleições ou na realidade da aplicação das doutrinas. Desde antes dos tempos de Naphta, os ideólogos eram mestres em vender gato por lebre, usando as palavras e atribuindo-lhes os significados exatamente opostos. Seja pelo uso do flamejante amor divino ao se tratar de hereges, seja ao falar em limpeza, referindo-se ao “trabalho sujo” de eliminar “impurezas étnicas”, seja por fim, como em Orwell, instaurando os ministérios de amor, cujo assunto eram as torturas. O papel da poesia aqui, como vemos, não vai se restringir a apenas analisar estes fenômenos. Ela precisará nomear as coisas novamente, inserir-lhes os devidos valores, em suma, reconstruir a ética no mundo depois da morte de Deus.

O problema com a ética, como nota Barańczak, é que ela se baseia no princípio de autoridade. E não é uma autoridade fundamentada pela empiria. As bases da ética propostas pelas autoridades morais são inexplicáveis e irracionais, como as de Naphta. Essas autoridades morais nos obrigam à obediência cega, sem críticas. Ouvimos que isto é bom para a comunidade, politicamente correto, necessário para um bom funcionamento do mundo. E seguimos sem reflexão, nos sentindo liberados das responsabilidades individuais. Esta ética fácil, ética do rebanho, se encontrava no alicerce dos totalitarismos, assim como se encontra no alicerce do mundo de hoje.

Poderíamos pensar na versão mais moderna de A montanha mágica, escrita por Ken Kesey nos Estados Unidos, nos anos sessenta, a meio caminho entre os movimentos beat e hippie. O romance Um estranho no ninho nos presenteia com as versões modernas de Naphta – A Grande Enfermeira e Settembrini – Randle Patrick McMurphy. A força do dogma e da autoridade moral contra o espírito da liberdade representados pelos personagens reciclam os valores de Naphta e Settembrini. Enquanto em nome do bem dos pacientes a Grande Enfermeira os escraviza, o pequeno criminoso tenta libertá-los do poder do sistema. O sistema é percebido pela versão moderna de Castorp, Chefe Bromden. Seja pela visão xamanista, seja pela visão da loucura, Bromden é o homem que nos conta a história, após ter sido libertado pelo sacrifício de McMurphy. O sistema na sua visão é uma Máquina que transforma os seres humanos em máquinas, substituindo-lhes os órgãos pelas rodas dentadas e outros mecanismos. A poesia de McMurphy está longe do humanismo de Settembrini, mas passa pelo humanitarismo, que é a base de uma nova ética. Mais ainda: a sua principal arma contra o sistema é o riso. O riso que consegue sacudir a hierarquia e que restaura a humanidade.[4]

Voltando ao ensaio de Barańczak, ele vê a poesia no mundo moderno como um dos poucos modos possíveis de expressar conteúdos filosóficos. Por isso ela se vê diante da obrigação de resistir perante os conteúdos fáceis e perniciosos oferecidos pelas doutrinas. Além da morte do Deus, diz o estudioso, morreram também os deuses das autoridades morais, aos quais a  meu ver devem ser acrescentados os deuses dos pequenos valores cotidianos e dos grandes valores humanos. Os conteúdos propostos pelas doutrinas midiatizadas não oferecem nada de interessante para substituí-los. Muito pelo contrário, por meio do isolamento individual, no qual não se cultiva a prática nem tampouco a reflexão sobre o humano, nos desumanizam, nos privam da ética. Diante disso, o postulado de Barańczak é que a poesia e a arte têm que se encarregar de criar um novo decálogo. Não adianta basear o tal decálogo nos dogmas irracionais, porque o mundo de hoje é prático e rejeita tudo o que não seja prático. As autoridades externas, como no mundo do personagem McMurphy são mentirosas, suspeitas ou inoperantes. Nesta situação, como nos mostra o exemplo de Um estranho no ninho, a única base para criar uma autoridade moral é um outro ser humano e a nossa relação com ele. Não se trata mais do homem abstrato como no caso de Settembrini, mas concreto, como no caso dos poetas ou do protagonista de Kesey: o ser humano concreto, insultado, escravizado, espancado, morto. Somente por meio da relação com o outro e a identificação com ele é que conseguimos compreender o mal que consiste em violar ou destruir a autonomia individual de alguém. E não há dogmas que possam santificar e justificar este mal. Só assim, de acordo com o estudioso, por meio do preceito cristão de “amar o seu próximo como a si mesmo” conseguimos criar uma ética sem autoridades. Quando a fonte e a medida dos valores é o outro, não somente o humanismo, mas também a humanidade são despertados. O papel do poeta é não deixar que essa humanidade dentro dele seja apagada ou sufocada. Graças a ele, o leitor é fortalecido e despertado para a sua própria humanidade. Mais ainda: o ensaísta vê esta ética poética como extremamente prática, pois, como diz, quando entendo que a violação dos direitos do outro ser humano é a violação dos meus direitos, sou capaz de defendê-lo, tanto por me identificar com ele emocionalmente, quanto por saber que posso ser o próximo na fila. Barańczak, poeta e dissidente, membro do Comitê de Defesa dos Trabalhadores, perseguido pelo sistema, era o testemunho vivo das suas palavras.

E o que isto tem a ver com a poesia?

A reposta dada pelo estudioso à pergunta é que a poesia no mundo de hoje é um dos poucos domínios do pensamento não dogmático. Uma das poucas maneiras de controlar o esquema dogmático. O dogma sempre falará da massa e dos seus direitos. A poesia permanece fiel aos concretos e ao indivíduo. Mostra as consequências dos dogmas nos indivíduos.

“Enquanto o dogma colocando a seu serviço os meios de comunicação de massa opera com os métodos de pensamento e de expressão que tendem ao uso da persuasão imperceptível, com a qual se pode manipular as massas humanas, a poesia coloca como seu objetivo tirar o ser humano do automatismo linguístico, do automatismo ao pensar”[5]. Por meio da poesia, observa Barańczak, o ser humano aprende a pensar, falar e agir por conta própria. A poesia de hoje deixou de ser a voz do Parnaso e se transformou na voz de um homem no meio da multidão. A única coisa que diferencia este homem é o fato de ele sentir mais e expressar mais que os outros, e de modo mais consequente e mais sincero. Nisto o estudioso vê a é a sua fraqueza e a sua chance.

Kierkegaard diz que a ironia é uma formação que sempre aparece nos momentos cruciais da história do mundo[6]. Acontece quando não se consegue mais aceitar a realidade ao redor, porque sua forma parece imperfeita, mas ainda não há nada que possa substituí-la. Neste momento o eu irônico inicia o processo contra o mundo.

Às vezes a ironia é o único método para expressar as coisas que não seriam expressáveis de outras maneiras. A sua operação funciona como o processo poético: falamos uma coisa para dizer uma outra, geralmente oposta. Como na metáfora, a ironia utiliza a linguagem para ultrapassar os seus limites. Ironia é uma forma de se libertar da realidade que nos circunda e prende. O ironista de algum modo foge desta prisão, fornece um quinhãozinho de liberdade, desmascara o dogma no qual a realidade está baseada, e por um momento a ironia eleva o ironista acima da realidade opressiva, dá-lhe a possibilidade de rir, de chacotear, de comprometer a realidade, o dogma, o sistema.

O discurso irônico é por base desmascarador: revela as contradições existentes entre as expectativas e a realidade. O hiato entre a realidade e o discurso, ao mesmo tempo que desmascara as falhas da realidade, desnuda também a impotência do ironista diante do mundo. O desmascaramento é duplo: o mundo não é o que deveria ser e o ironista não pode fazer nada contra isso, a não ser mostrar este fato. Ao mesmo tempo, por meio do uso da ironia manifesta-se a superioridade do ironista em relação ao objeto da ironia. Mais ainda, por meio da ironia cria-se uma espécie de pacto dos fracos – os que entendem a ironia. A cumplicidade que há entre o sujeito que ironiza e seus leitores ou ouvintes cria uma proximidade: estamos usando o nosso código secreto, que é incompreensível para os não-iniciados.

Na parte que se segue, gostaria de apresentar um exemplo para apoiar estas reflexões teóricas. Discutindo dois poemas da autora polonesa Wisława Szymborska, tentarei demonstrar o uso da ironia neles. A autora, vivendo na época sob o regime comunista, utiliza-se da ferramenta da ironia para desmascarar tanto o regime em particular quanto o ser humano e a sua tendência para criar os regimes deste tipo. Preso nas utopias, nas palavras dogmáticas, ansioso pela segurança e pela liberdade, o homem com todos os seus paradoxos é um grande tema de seus versos.

 

Salmo

 

Ó como são permeáveis as fronteiras dos reinos humanos!

Quantas nuvens flutuam impunemente acima delas,

quantos grãos de areia do deserto deslizam de um país para outro,

quantas pedrinhas rolam para dentro das propriedades alheias

saltando desafiadoramente!

 

Será que preciso mencionar um por um, cada pássaro que voa,

ou que pousa neste momento na cancela abaixada?

Nem que seja um pardal – a sua cauda já é forasteira,

enquanto o seu biquinho continua local. Além disso, como se agita!

 

Dos inúmeros insetos me limitarei a mencionar a formiga,

que entre a bota direita e a esquerda do guarda

nem se digna a responder

a pergunta: de onde para onde.

 

Ó, ver com exatidão, de uma vez, toda essa desordem,

em todos os continentes!

Pois não é a mexeriqueira da margem oposta

Que contrabandeia pelo rio sua enésima folha?

Quem se não o polvo, com os tentáculos ousadamente longos,

viola a sagrada zona das águas territoriais?

 

Como sequer se pode falar de uma ordem qualquer,

se nem dá para empurrar as estrelas,

para que fique claro, qual delas brilha para quem?

 

E ainda este hábito repreensível de se espalhar que a neblina tem!

E a polinização da estepe em toda a sua extensão,

como se nem estivesse cortada ao meio!

E o ressoar das vozes sobre as servis ondas do ar:

chiados sedutores e gorgolejos conspiratórios!

 

Só aquilo que é humano consegue ser verdadeiramente estranho

O resto são florestas mistas, buracos de tatu e vento. [7]

 

O livro de Wisława Szymborska de 1976, de onde foi extraído este poema, chama-se Wielka liczba (Um grande número). Tadeusz Nyczek[8] vê nele o interesse da autora pelo excesso, e faz a relação deste título com o título do livro anterior Wszelki wypadek (Qualquer caso).A inconcebibilidade do mundo e da vida, representa também, por oposição, o interesse da poeta no ser humano individual. O mundo como algo demasiadamente grande para nossas capacidades perceptivas e habilidades de usá-lo aparece em muitos dos seus versos. A incalculabilidade e a incontabilidade são dois grandes conceitos ao redor dos quais gira essa poesia, nota Nyczek. Frequentemente o incontável, o vasto universo nos surpreende de modos imprevisíveis e os resultados disso podem ser incalculáveis. Se por um lado a vastidão e incomensurabilidade do universo encantam, por outro, espantam. Principalmente quando pensamos no ser humano individual que tem que lidar tanto com a infinitude do universo, quanto com a massificação e “universalidade” das ideias massificadoras. Neste caso a ironia, além de ser uma arma que pode ser usada para denunciar os dogmatismos, também é uma arma contra a condição finita do ser humano perante a infinitude do universo. Por meio dela, além de se criar o distanciamento dos dogmas ideológicos e condições políticas, cria-se o distanciamento de sua própria condição existencial, vencendo-a por um momento. “A vingança da mão mortal[9]” contra o universo infinito, por meio da palavra poética, metafórica, irônica.

Desde o início do poema, a autora coloca diante de nós um paradoxo: um poema sobre o milagre e a maldição da liberdade, como observa em seu estudo Tadeusz Nyczek. Parece que Szymborska, como Heráclito, acredita que tudo que é grandioso tem de ser paradoxal e isso transparece em vários poemas dela. O paradoxo aqui é mais fácil de resolver, pois o milagre e a maldição nesse poema é uma questão de ponto de vista.

De acordo com a análise de Nyczek, se quisermos ler o poema como hino à liberdade, podemos fazê-lo desde o primeiro verso, no qual o eu lírico exclama em admiração: “Ó como são permeáveis as fronteiras dos reinos humanos!” O fato de que a natureza parece não aceitar as fronteiras humanas, de que passa por elas sem se dignar a dar qualquer satisfação, provoca um encanto. A natureza em vários versos de Szymborska não segue as regras que os humanos tentam estabelecer sobre a terra. Em vários momentos, por exemplo no poema “Conversa com a pedra”, transparece a incomunicabilidade entre o homem e a natureza. São mundos, na visão da autora, demasiadamente distintos.

E assim vemos aqui que as fronteiras estão sujeitas a serem ultrapassadas pela areia, nuvens, pedras saltitantes, folhas, formigas, pássaros, polvos, neblina e pólen, que não se dignam a dar a mínima satisfação, como se tivessem um passaporte diplomático no bolso. Sem dúvida, nota o estudioso, é uma maneira interessante de comentar a contribuição humana para o universo, mas ao mesmo tempo, talvez por conta do acúmulo de verbos de movimento, sentimos no poema um ar de inveja da liberdade desmesurada da natureza. Pois todo este movimento de deslizar, flutuar, rolar, saltitar, voar, agitar-se, contrabandear, violar, espalhar-se, ressoar se dá ao som de chiados e gorgolejos, enumerados por Nyczek, vibra com a vida, vibra com a alegria. A alegria de ser livre, de poder expressar esta liberdade de ir e vir sem se preocupar com as fronteiras. Em contraste com este movimento que significa a vida, as fronteiras são imóveis. A sua cristalização, estagnação, falta de movimento evoca a morte. E quem conheceu as fronteiras dos países fechados atrás da cortina de ferro totalitária entende tanto o fato de a fronteira ser uma área estéril, portanto área de não-vida, quanto o fato de ser uma área possivelmente mortífera. O contraste entre o movimento e a estagnação permite- nos vislumbrar a primeira sombra neste quadro de hino à liberdade incontida da natureza. Talvez, ao lado da vontade humana de ter a liberdade desmedida da natureza, exista um sonho de uma liberdade possível.  O milagre da liberdade de uma forma ou de outra não passa de um sonho…

E quanto à maldição da liberdade? Ao olhar o poema mais cuidadosamente, Nyczek nota alguém muito preocupado com a ordem, alguém que parece questionar a liberdade da natureza. Os termos como permeabilidade, impunemente, propriedade alheia, contrabando e hábitos repreensíveis não poderiam ter sido usados por um amante da liberdade. Do mesmo modo o título, que deveria sugerir uma conversação com Deus, seja uma súplica ou louvor, lamentação ou gratidão parece destoar um pouco do conteúdo do poema. O cântico sagrado, como se traduz do grego o nome deste fruto espiritual e artístico da cultura judaica, como aponta Nyczek, parece servir aqui como uma pista. Se por um lado vemos um hino à natureza e à liberdade, por outro, percebemos elementos estranhos nesse hino. Embora o “Salmo” comece com um Ó, como um bom salmo deveria começar, em vez de ouvirmos na sequência o nome do destinatário, evocado com o vocativo, recebemos diretamente a informação sobre o estado das coisas. Será que pelo fato de os poloneses serem conhecidos como pessoas diretas (às vezes até excessivamente), eles renunciam por isso ao nome do invocado após o Ó vocativo? Mas na sequência do texto continuamos lendo, como no primeiro verso, as informações misturadas com o contínuo queixume. Em vez de uma oração, temos aqui um tom estranho e informações estranhas… Parece que é a queixa contra a realidade, que não se comporta de modo adequado. O nosso salmo, diz Nyczek, parece ser uma denúncia. O eu lírico aqui parece um funcionário que está escrevendo uma delação para o seu deus, o seu superior, que o mundo anda meio subversivo.

Tivemos nos países do bloco soviético vários tipos de funcionários que poderiam ser autores de semelhante carta, certamente não uma escrita com esse grau de sofisticação. O ensaísta nos faz lembrar de um exército de censores, policiais, soldados de inteligência ou contraespionagem, guardas de fronteira e, por último, mas não menos importante,  de funcionários do Serviço de Segurança Pública, que defendia o bem-estar do “melhor dos sistemas concebidos na face da terra”. Tudo naqueles países era controlado, guardado, vigiado, de modo a se ter certeza de que não aconteceria nada que pudesse questionar a única direção certa, a do partido comunista. O passaporte pertencia ao país e não ao cidadão, e era concedido a este por pouco tempo, em raras ocasiões e contra a vontade daqueles que tinham a responsabilidade de guardá-lo, recorda Nyczek.

O mundo de Orwell, aliás, um autor proibido na Polônia comunista, de vigilância constante, que chegaria a penetrar o pensamento e moldá-lo à vontade do partido, era um sonho dos engenheiros das almas humanas e o pesadelo de quem teve que viver as realidades por eles criadas. Imaginemos que um dos funcionários deste sistema, brilhantemente, sem dúvida, percebe que a natureza ultrapassa todas as fronteiras. E além do mais, nem se preocupa em obter qualquer tipo de autorização. Escandalizado com este fato, este especialista naquilo que é correto, preocupado com paz e segurança, escreve a lamentação ao seu superior.

Partindo dessa possibilidade de interpretação, entende-se todo o vocabulário ligado à perturbação da lei: impunemente flutuam, contrabandeia folhas, viola a sagrada zona de águas territoriais, hábito repreensível de se espalhar. Mais ainda, o nosso ávido funcionário fala usando uma linguagem de propaganda comunista: longos tentáculos, ondas servis do ar, chiados sedutores e gorgolejos conspiratórios são tentativas de adaptar ao português a linguagem que ainda espera por seu Victor Klemperer.[10]

No final dessa denúncia poética, percebemos termos científicos sofisticados como florestas mistas, para sugerir a impureza e o uso de fraseologismo “krecia robota” que nos remete ao milagre e à maldição de traduzir Szymborska. O significado literal, o trabalho de toupeira, que poderia ser traduzido literalmente sem perder o sentido de trabalho subversivo, que esse termo tem, para o inglês ou o italiano, em português perde qualquer sentido. Como substituí-lo? Pensei em sapotagem, canarquia, um amigo me soprou subvermissão, mas acabei optando por um fraseologismo do português que não reflete a mesma coisa, mas dá uma ideia de esconderijo e de coisas ocultas aos olhos do nosso guarda – o buraco de tatu, mantendo a metáfora da natureza e da cavação de buracos. O vento do final do verso, então, deixa o nosso funcionário desesperado: invisível, impossível de ser capturado, sempre móvel, soprando ao redor – uma afronta para os que querem guardar a ordem e a única verdade verdadeira.

Para falar um pouco mais de algumas das angústias tradutórias devo trazer ainda a palavra mątwa, que em polonês é apenas lula. Mas o seu nome é derivado do verbo mącić – turvar, o que claramente daria mais sentido à queixa que constitui este poema. Além de substituir a lula por seu parente, o polvo, coisa nada estranha no mundo das lulas e dos polvos, diga-se de passagem, resolvi cometer ainda mais uma traição em relação ao texto original, substituindo a alfeneiro (Ligustrum vulgare),  planta europeia pouco conhecida no Brasil, pela suculenta mexeriqueira, que deve no leitor brasileiro causar a mesma impressão que mątwa causa aos poloneses, por sua relação familiar com os mexericos.

Voltando ao poema, ele é afinal o hino à liberdade ou o hino ao controle, pergunta Nyczek? Talvez ambos, sugere. A graciosidade e a arte de Szymborska fazem com que a construção seja bastante pérfida. A adoração da liberdade é transmitida pela boca do guarda que, mesmo sem saber disso, contraria o seu objetivo em sua oração sobre a nocividade da liberdade. A forma e o conteúdo estão em contradição intencional, aquele que fala não sabe que revela o que gostaria de ocultar. A ironia é tão significativa que as frases como: “Ó ver com exatidão, de uma vez toda essa desordem em todos os continentes!” poderiam ser pronunciadas pelo Big Brother de Orwell e por um entusiasta do anarquismo. A nota final de amargura fica por conta da constatação de que “só aquilo que é humano consegue ser verdadeiramente estranho”. Só a natureza é realmente livre na visão da autora, mesmo que não possua a consciência para aproveitar tal fato, enquanto o rei da criação só cria barreiras, fronteiras e cancelas… O diálogo irônico de Szymborska com o pensamento de Terêncio, que foi um bordão da Renascença: Homo sum; humani nil a me alienum puto, ou em português, “Sou homem; nada do que é humano me é estranho”, além de fazer referência à herança cultural europeia, também zomba dos ideais ingênuos dos humanistas. Pois estes, arrogando-se o direito de saber tudo sobre o ser humano, criaram bases para o melhor dos sistemas, uma utopia que se transformou em distopia encarnada no mundo real. O sonho que, aplicado à realidade, virou pesadelo, um lugar onde se falava de altos ideais e se vivia o seu exato oposto. Essa fala de Szymborska, que passou por um momento de fascínio com a ideia comunista, compactuando com ela durante algum tempo, diz algo que me lembra o fim de um outro pacto. Como diz o Riobaldo: “O diabo não há! É o que eu digo, se for … Existe é homem humano. Travessia.”(ROSA, 1994, p.385.)

Nos seus poemas, depois do engajamento no comunismo e a amarga decepção com a ideologia, a poeta fugia dos temas políticos. A percepção de que as ideologias podem ser mais perigosas que o progresso da ciência e de que utilizam a boa fé das pessoas para fins políticos, frequentemente espúrios, foi o que ficou como lição da aproximação com o comunismo. Mesmo engajada pessoalmente no apoio aos movimentos de oposição ao sistema, parceira de vida de Kornel Filipowicz, um escritor ativamente engajado na oposição, Szymborska não quis repetir o erro de comprometer a sua poesia com a política novamente. Mas nos tardios anos setenta e principalmente nos anos oitenta, após a introdução da Lei Marcial para destruir o movimento do Solidariedade, a autora resolveu criar alguns textos mais críticos sobre o sistema. Claro que não deixava de lado a sua maneira de fazer os textos soarem ao mesmo tempo universal e particularmente. As alusões, grande arma dos autores sob o sistema totalitário, aparecem na sua poesia deste período Talvez o poema “Opinião sobre pornografia” (“Głos w sprawie pornografii”), que veremos na sequência seja um dos melhores exemplos do uso desse artifício.

Como a autora mesmo diz num outro poema do livro Ludzie na moście (Gente na ponte, 1987):

 

“Os filhos da época”

 

Somos os filhos da época,

e a época é política.

 

Todas as coisas – minhas, tuas, nossas,

coisas de cada dia, de cada noite

são coisas políticas.

 

Queiras ou não queiras,

teus genes têm um passado político,

tua pele, um matiz político,

teus olhos, um brilho político.

 

O que dizes tem ressonância,

o que calas tem peso

de uma forma ou outra – político.

 

Mesmo caminhando contra o vento

dos passos políticos

sobre solo político.

 

Poemas apolíticos também são políticos,

e lá em cima a lua já não dá luar.

Ser ou não ser: eis a questão.

Oh, querida que questão mal parida.

A questão política.

 

Não precisas nem ser gente

para teres importância política.

Basta ser petróleo, ração,

qualquer derivado, ou até

uma mesa de conferência cuja forma

vem sendo discutida meses a fio.

 

Enquanto isso, os homens se matam,

os animais são massacrados,

as casas queimadas,

os campos se tornam agrestes

como nas épocas passadas

e menos políticas.[11]

 

Os poemas apolíticos também são políticos, o que é dito ressoa e o que não é dito também tem seu peso e significado. Ao mesmo tempo no poema ressoa a ironia de se viver num país onde tudo era político. As sufocantes afirmações sobre a politização de todas as esferas da vida, advindas da doutrina marxista adotada pelo sistema, resultam num poema que por meio da repetição, tanto demonstra o problema, quanto o ridiculariza. O arremate irônico desnuda o fato da universalidade das ações do ser humano, que, independente de ser politizado ou não, continua se comportando como uma praga.

Assim, no poema que dá título ao livro Gente na ponte, temos uma reflexão universal sobre a pintura de Hiroshige Utagawa, com versos que poderiam ser lidos diferentemente no contexto da Lei Marcial, que tentou parar o tempo, impedir as mudanças, congelar a época. A reflexão universal torna-se alusiva: “Estranho planeta e nele essa gente estranha/Sujeita ao tempo, não o reconhece (…) É difícil passar sem um comentário:/Esse não de modo algum um quadro inocente./Aqui o tempo foi suspenso./Deixou-se de levar em conta as suas leis./Foi privado da influência sobre os eventos./Foi desrespeitado e insultado.” (tradução de Regina Przybycien)[12]. O título pode se referir aos poloneses na época da suspensão da passagem de uma ordem para outra, momentaneamente congelados no tempo comunista. Assim como em outros poemas desse volume, já publicados em português: “Torturas”, “Ocaso do século”, “Escrevendo um currículo”, e os que ainda aguardam a sua versão: “Conluio com os mortos” (“Konszachty z umarłymi”), “Do arki” (“Para a arca”), podemos enxergar possibilidades interpretativas, que uniriam o universal com a situação política particular da época, por meio de alusões e entrelinhas. Voltemo-nos a alguns exemplos num dos poemas deste livro, traduzido por Regina Przybycien.

 

“Opinião sobre a pornografia”

 

Não há devassidão maior que o pensamento.

Essa diabrura prolifera como erva daninha

num canteiro demarcado para margaridas.

 

Para aqueles que pensam, nada é sagrado.

O topete de chamar as coisas pelos nomes,

a dissolução da análise, a impudicícia da síntese,

a perseguição selvagem e debochada dos fatos nus,

o tatear indecente de temas delicados,

a desova das ideias – é disso que eles gostam.

 

À luz do dia ou na escuridão da noite

se juntam aos pares, triângulos e círculos.

Pouco importa ali o sexo e a idade dos parceiros.

Seus olhos brilham, as faces queimam.

Um amigo desvirtua o outro.

Filhas depravadas degeneram o pai.

O irmão leva a irmã mais nova para o mau caminho.

 

Preferem o sabor de outros frutos

da árvore proibida do conhecimento

do que os traseiros rosados das revistas ilustradas,

toda essa pornografia na verdade simplória.

Os livros que os divertem não têm figuras.

A única variedade são certas frases

marcadas com a unha ou com o lápis.

 

É chocante em que posições,

com que escandalosa simplicidade

um intelecto emprenha o outro!

Tais posições nem o Kamasutra conhece.

 

Durante esses encontros só o chá ferve.

As pessoas sentam nas cadeiras, movem os lábios.

Cada qual coloca sua própria perna uma sobre a outra.

Dessa maneira um pé toca o chão,

o outro balança livremente no ar.

Só de vez em quando alguém se levanta,

se aproxima da janela

e pela fresta da cortina

espia a rua.[13]

 

Este poema em particular precisa de explicações maiores, pois as práticas nele descritas felizmente pertencem momentaneamente ao passado e eram bastante comuns na época. Temos aqui uma reunião conspiratória dos intelectuais, aqueles que pensam e que por meio do pensar já estão conspirando: “não há devassidão pior que o pensamento”. Novamente, como no “Salmo”, o eu lírico do poema é alguém que poderia ser denominado, segundo Nyczek,[14] de guarda da moral comunista. Seja ele policial censor, delator, foi assim como no “Salmo”  ridicularizado e ironizado por meio da identificação do processo subversivo de pensar com a pornografia. Claro que o pensar não é inocente: “ele prolifera como a erva daninha no canteiro demarcado para margaridas”, que seguem a única linha certa do pensar na fileira do pensamento progressista liderado pelo partido. Os subversivos reunidos cometem o sacrilégio de chamar as coisas pelos nomes, em vez de seguir o costume de usar aquilo que Orwell denominou de “newspeak” e que foi traduzido para o português como novilíngua. Novilíngua era o estilo de escrever e falar preocupado com turvar todos os sentidos e simplicidades. Talvez o falar politicamente correto seja alguma espécie de parente da novilíngua. De um modo ou de outro, como diz Nyczek, tratava-se de falar de uma maneira a não se dizer efetivamente nada. “E os subversivos reunidos aqui querem chamar as coisas pelos nomes!” (NYCZEK, 2002, p.100)

O outro delito é a “perseguição selvagem dos fatos nus”. Usar os fatos era algo que a propaganda comunista condenava. Ainda mais se eram os fatos nus, como as prateleiras nuas nas lojas, a economia vergonhosamente destituída de funcionalidade, políticos desveladamente mentirosos, ou a vida despida de sentido pelo sistema, cujo fracasso se via a olhos nus. Isto eram “os temas delicados”, que aparecem na linha abaixo “tateados indecentemente”. Logo na sequência temos a desova das ideias, algo no mínimo condenável pelo sistema no qual “só podia existir uma ideia: a correta. Que tudo está bem e que vai ficar melhor ainda. Logo, logo” (NYCZEK, 2002, p.101), quando chegarmos ao verdadeiro comunismo e quando “nesta luta final/ uma terra sem amos”[15] tornar-se internacional, sob o domínio, ou como queria a linguagem oficial da época, a liderança da União Soviética.

No início da quarta estrofe, temos a referência à árvore proibida do conhecimento – a circulação da informação era proibida. Escutar as rádios do mundo ocidental, que transmitiam a informação, ler livros e jornais que ajudavam a formar o conhecimento sobre a realidade na qual vivíamos, era proibido. E espalhar essas informações e este conhecimento era algo que podia render repressões e condenações. Mesmo assim “um amigo desvirtuava o outro, filhas depravadas degeneravam o pai, o irmão levava a irmã mais nova para o mau caminho”, as informações espalhavam-se, “os intelectos com escandalosa simplicidade emprenhavam um ao outro”. Szymborska aproveita, como nota Nyczek, as alegorias sexuais para mostrar que tanto o pensar quanto a pornografia precisam de lugares reservados e são atividades proibidas, pelo menos eram naquela realidade totalitária. Vemos no fim do poema a pessoa espreitar o meio da rua, para ver se a reunião não era observada por algum vigilante da lei. O fato de as duas atividades serem proibidas abriu o campo para a inventividade linguística e o humor de Szymborska, cujas pérolas devem ter dado muita dor de cabeça à tradutora. A relação erótica, isto é, amorosa, entre a ideia e seus amantes, o papel impresso e seus devotos é uma outra percepção surpreendente. O desejo de saber e o desejo sexual como paralelos, o sabor do proibido que se une às descobertas, a clandestinidade dos dois naquele sistema mostra a sua antinaturalidade. Além de Szymborska driblar a censura com a técnica digna de um Garrincha poético, ainda faz o leitor pensar sobre a loucura de um sistema que força as pessoas à clandestinidade para saciar o desejo sexual e o desejo de conhecimento, a livre troca de ideias e vivência de fantasias, sejam elas fantasias de sexualidade, de afeto ou de outro tipo de livre autoexpressão. A capacidade de pensar independentemente, a expressão desse pensamento, por mais que seja louvável, mesmo numa sociedade democrática, nem sempre é vista com bons olhos; os conformistas são mais apreciados. A repetição do pensamento alheio é sempre mais segura que a coragem para formular o seu próprio. As pessoas preferem aderir aos grupos que pensam de modo semelhante, abdicam de expressar a si mesmas. O pensamento independente em alguns ambientes até hoje é visto como algo vergonhoso. Quem pensa por si mesmo é visto como alguém perigoso ou no mínimo incômodo. Imaginem nos tempos de então, quanta coragem era preciso ter para se colocar contra o sistema. Mesmo assim Szymborska faz isso com graça e bom humor. Como uma das pessoas que participavam dessas reuniões libertárias, sabia também que o humor é salutar para desinflar um pouquinho a seriedade com que os oposicionistas se viam no combate ao sistema, daí a comparação com a pornografia.

Tivemos a oportunidade de ver aqui duas das manifestações da autora que graciosa e impiedosamente descrevem os tempos nos quais foi dado a ela viver e escrever. A universalidade desses textos deve-se por um lado à técnica poética da poeta, por outro, infelizmente, às características intrínsecas da humanidade, que mesmo tendo oportunidade de observar várias lições do passado, prefere não olhar para trás e, desbravando horizontes novos e progressistas, acaba repetindo os mesmos velhos erros do passado. É preciso aprender o sorriso e a leveza da ironia de Szymborska para lidar com isso, apesar dos pesares.

 

BIBLIOGRAFIA

 

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[1] O presente trabalho foi realizado com apoio do CNPq, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico  e Tecnológico – Brasil.

[2] Professor de literatura polonesa na UFPR, doutorando em literatura na UFSC, tradutor. O autor agradece a revisão deste texto a Eneida Favre.

[3] BARAŃCZAK, Stanisław. “Zmieniony głos Settembriniego” in: Etyka i poetyka. Znak: Kraków, 2009. pp.27-38.

[4]Como mostra Bakhtin (1996) quando analisa a cultura popular da Idade Média e Renascimento.

[5] BARAŃCZAK, 2009, p. 37

[6]KIERKEGAARD, Sören. O conceito da ironia: Constantemente referido a Sócrates. Apresentação e tradução Álvaro Liz Montenegro Valls. Petrópolis: Vozes, 1991, p.227:

[7] São de minha autoria todas as traduções neste trabalho, exceto quando indicado em nota o tradutor.

[8] A análise trazida aqui é baseada no trabalho de Tadeusz Nyczek, que em seu livro  22 x Szymborska (Gdańsk: Tower Press, 2002) dedica o capítulo 15 à interpretação deste poema (páginas 77-82).

[9] SZYMBORSKA Wisława. “A alegria da escrita”. In: Poemas, seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien. Companhia das Letras, São Paulo – 2011. p.36-37

[10] Em seu estudo LTI: a linguagem do Terceiro Reich. (Rio de Janeiro: Contraponto, 2002) Victor Klemperer fez uma análise de como a propaganda nazista alterou a língua alemã, para inculcar as ideias nacional-socialistas nas pessoas. Como curiosidade podemos notar que na Polônia o livro, originalmente editado em 1947, só veio a lume nos anos oitenta, depois da liberação da censura na época do Solidariedade. O recurso de usar as palavras nazismo ou totalitarismo para se falar do comunismo era tão comumente usado (e automaticamente driblava a censura) que a análise de linguagem de um totalitarismo facilmente poderia ser lida no contexto do outro. Na Polônia as tentativas de analisar a linguagem do comunismo, especificamente a que foi utilizada durante perseguição antissemita promovida pelo governo comunista do país em 1968, foram feitas por Michał Głowiński em Marcowe gadanie. Komentarze do słów 1966-1971. Varsóvia: PoMost, 1991 e em Nowomowa i ciągi dalsze. Szkice dawne i nowe. Cracóvia: Universitas, 2009.

[11]Tradução de Ana Cristina César. O poema pode ser encontrado em:  OLIVEIRA,Bruno Reis de; OLIVEIRA Flávia Costa; RODRIGUES, Stéphanie Paes (org.) Noite dilacerada: poezjapolaca de guerra.Edição bilíngue. Belo Horizonte: Viva voz, FALE, UFMG, 2010. p. 17. Disponível em:  <http://www.letras.ufmg.br/vivavoz/data1/arquivos/noitedilacerada-site.pdf>, acesso em 23.07.2014.

[12] SZYMBORSKA, 2011, p.89.

[13] SZYMBORSKA, 2011, p.85.

[14] Nesta análise me baseio na interpretação de Tadeusz Nyczek, que em seu livro 22 x Szymborska dedica o capítulo 18 à interpretação deste poema. (NYCZEK, 2002, p.97-102).

[15] Citação do hino que ecoava todo dia nos países do bloco sob o domínio soviético, A Internacional.