Entre sertões: esboço para uma crítica à hispanização do termo jagunço em uma tradução de Grande Sertão: Veredas ao espanhol – Vássia Silveira
Entre sertões: esboço para uma crítica à hispanização do termo jagunço em uma tradução de Grande Sertão: Veredas ao espanhol
Vássia Silveira[1]
Em 1957, Antonio Candido afirmou: “Na extraordinária obra-prima Grande Sertão: Veredas há de tudo para quem souber ler” (2002, p. 121).[2] E Candido, como um vate, estava certo. Mais de meio século após o lançamento de Grande Sertão: Veredas (1956), a obra mestra de João Guimarães Rosa (1908-1967) segue provocando seus leitores e suscitando, no que diz respeito à crítica literária, as mais diferentes abordagens ao texto – solidárias ou não às três principais linhas de pesquisa que compõem sua fortuna crítica e que se debruçam, grosso modo, em elementos histórico-sociais, metafísicos ou da linguagem.[3]
Diante de tal diversidade, este trabalho tem como proposta pensar, a partir da decisão do tradutor Ángel Crespo (1926-1995) de hispanizar o termo jagunço e tendo como recorte a cena do julgamento de Zé Bebelo, nas possíveis implicações que a adoção de determinada linha de leitura do Grande Sertão: Veredas pode apresentar para a tradução. Neste sentido, a escolha feita foi a de percorrer o olhar histórico-social da obra – aquele inaugurado por Antonio Candido no ensaio “O Homem dos Avessos”[4] – que nos permite ler o Grande Sertão: Veredas não apenas como um texto literário que interpreta e representa o Brasil; mas também como um diálogo com Os Sertões (1902), de Euclides da Cunha (1866-1909); ou, como defende Willi Bolle, uma reescrita crítica da obra de Euclides; e uma alegoria pertinente e atual das estruturas de poder do país (BOLLE, 2000; 2007).
A ideia de que Grande Sertão: Veredas dialoga com Os Sertões de Euclides da Cunha não é uma novidade. Pode-se inclusive dizer que ela foi esboçada pela primeira vez por Antonio Candido ao observar que a estrutura de ambos estava fincada no tripé terra-homem-luta (CANDIDO, 2011). É verdade que para o crítico brasileiro a analogia entre essas duas grandes obras literárias parava aí, “não só porque a atitude euclidiana é constatar para explicar, e a de Guimarães Rosa inventar para sugerir, como porque a marcha de Euclides é lógica e sucessiva, enquanto a dele é uma trança constante dos três elementos” (CANDIDO, 2011, p. 123).
Mas não será exatamente esta diferença de abordagem que nos permite enxergar o sertão de Guimarães como uma espécie de resposta ao sertão euclidiano? Willi Bolle, crítico e pesquisador alemão radicado no Brasil, não parece guardar dúvidas sobre esta questão. Para ele, o que o autor de Grande Sertão: Veredas faz é mover “um processo contra o historiógrafo Euclides da Cunha em nome da verdade dos fatos e do uso da língua” (BOLLE, 2000, p. 4).
Segundo a euclidianista Renata Wasserman, Guimarães Rosa já havia sinalizado para o fato de que seu livro era uma espécie de reação ao de Euclides: “O próprio título já o indica, mas mesmo que fosse outro a comparação se teria imposto; afinal, a presença de Os Sertões na literatura brasileira é tão forte que outras obras situadas no mesmo ambiente cultural são quase que forçadas a dialogar com ela” (WASSERMAN, 2008, p. 171). No ensaio “Mapeando os Sertões: Congruências”[5], Wasserman não só aborda esta questão como também trata de refletir sobre a maneira como o diálogo entre as duas obras é estabelecido. Para Wasserman, a defesa inclusive de Willi Bolle de que Grande Sertão: Veredas pode ser lido como uma reescrita crítica d´Os Sertões nada mais é do que a aceitação do caminho indicado por Rosa em textos como “Pé-duro, chapéu-de-couro” (WASSERMAN, 2008), publicado em Ave, palavra, em 1952, do qual vale ressaltar o seguinte trecho:
“Todavia, foi Euclides quem tirou à luz o vaqueiro, em primeiro plano e como o essencial do quadro – não mais mero paisagístico, mas ecológico – onde ele exerce a sua existência e pelas próprias dimensões funcionais sobressai. Em Os sertões, o mestiço limpo adestrado na guarda dos bovinos assomou, inteiro, e ocupou em relevo o centro do livro, como se de sua superfície, já estatuado, dissesse de se desprender. E as páginas, essas, rodaram voz, ensinando-nos o vaqueiro, sua estampa intensa, seu código e currículo, sua humanidade, sua história rude.
Daí, porém, se encerrava o círculo.
De então tinha de ser como se os últimos vaqueiros reais houvessem morrido no assalto final a Canudos” (ROSA, 1985, p. 131).
Seguidor ou não das pistas de Guimarães Rosa, o fato é que ao analisar a relação entre as duas grandes obras da literatura brasileira e, sobretudo, o sistema jagunço em Grande Sertão: Veredas, Bolle revela elementos que julgamos significativos para avaliar a escolha de Crespo pela hispanização da palavra jagunço na tradução da obra de Guimarães ao espanhol – especialmente na cena do julgamento, que usamos como recorte nesta reflexão. Se, como afirma o crítico alemão, tanto este episódio “quanto o romance como um todo promovem uma revisão crítica da “maneira tendenciosa e arbitrária com que a palavra “jagunço” e a instituição da jagunçagem são apresentadas pelo autor d’Os Sertões” (BOLLE, 2000,p. 3), parece-nos razoável pensar no peso que o termo carrega no texto fonte, justificando, assim, outro olhar sobre a tradução do poeta e tradutor Ángel Crespo.
Breve notícia sobre Guimarães Rosa e o tradutor Ángel Crespo
Nascido em Codisburgo (MG), em 27 de junho de 1908, João Guimarães Rosa publicou seu primeiro livro, Sagarana, em 1946. Médico e diplomata, o autor de Grande Sertão: Veredas tinha profunda paixão pela língua – “a língua e eu somos um casal de amantes que juntos procriam apaixonadamente, mas a quem até hoje foi negada a bênção eclesiástica e científica” (ROSA, 2001, p. 9) –, manifestando interesse por outros idiomas ainda na infância – aos sete anos ele teria começado a estudar sozinho o francês. Uma curiosidade que, segundo o próprio Guimarães Rosa, era movida também pela consciência de que o aprendizado de outras línguas ajudava na compreensão do idioma materno, como atestam as palavras do escritor de Codisburgo em entrevista a Lenice Guimarães, em 1966:
“Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do tcheco, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. MAS, TUDO MAL. Eu acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudo-as por divertimento, gôsto e distração” (ROSA, 2006). [6]
Como poliglota e erudito – e talvez por saber das implicações que determinadas escolhas tradutórias podem representar diante da riqueza e peculiaridade da linguagem impressa em Grande Sertão: Veredas –, Guimarães Rosa manteve intensa correspondência com os tradutores de sua obra: Entre 1958 e 1967, o autor trocou mais de 370 cartas com seus tradutores[7], entre os quais Curt Meyer-Clason, Harriet de Onís, J. Jacques Villard e Ángel Crespo, este último responsável pela primeira tradução de Grande Sertão: Veredas ao espanhol.
Poeta, crítico e tradutor nascido em Ciudad Real, Barcelona, Ángel Crespo[8] verteu ao espanhol a obra mestra de Guimarães Rosa a convite da editora catalã Seix Barral. Sua versão, Gran Sertón: Veredas, foi publicada em fevereiro de 1967 – onze anos após o lançamento do livro no Brasil e no mesmo ano em que morreria Guimarães Rosa. Nela, o tradutor incluiu um glossário e uma introdução na qual dava mostras de que seu projeto tradutório preocupava-se com as singularidades do texto de partida:
“Hubiera sido gratuito por nuestra parte sustituir dichos términos por los correctos de nuestra lengua. Por otro lado, son muchos los nombres de animales, vegetales, alimentos y objetos de diferente índole que no tienen correspondencia exacta en nuestro idioma o cuya sinonimia sería muy problemática en el castellano hablado en América. En lugar de ofrecer una traducción siempre dudosa –y dado que su abundancia no es tanta como para dificultar la lectura– los hemos mantenido, pero ofreciendo su transcripción fonética o bien la ortográfica, cuando ambas no coinciden” (CRESPO, apud OLMO, 2011, p. 2).
Apesar da manifesta preocupação, do compromisso e dos acertos de Ángel Crespo – como a manutenção da oralidade, a recriação de neologismos e o uso de arcaísmos presentes do texto rosiano[9] – em sua tentativa de recriar no espanhol o estranhamento da linguagem de Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas, ao optar pela hispanização da palavra jagunço – yagunzo, na tradução ao espanhol –, o tradutor parece virar as costas para a historicidade sobre a qual nos alerta Schleiermacher:
“(…) sendo a língua um ente histórico, não pode haver autêntica sensibilidade para ela sem sensibilidade para a sua história. As línguas não se inventam, e trabalhar nelas ou sobre elas de modo puramente arbitrário é sempre um disparate; as línguas se descobrem pouco a pouco” (SCHLEIERMACHER, 2010, p. 65).
Ora, se o compromisso de Crespo era o de manter o estranhamento – e aqui podemos pensar que esta postura, pelo menos em tese, dialoga com a ideia de uma tradução não etnocêntrica –, por que não seguir, no caso da palavra “jagunço”, a orientação dada por Schleiermacher – “quanto mais se aproxima a tradução dos giros do original, tanto mais estranha será a impressão que o leitor recebe” (SCHLEIERMACHER, 2010, 71) – em 1813?
É verdade que Ángel Crespo incluiu no glossário de sua tradução o termo “yagunzo”, acompanhado da grafia em português e de uma explicação que reproduzimos a seguir:
“Yagunzo (jagunço): En un principio se dio este nombre a los individuos fanáticos que, a últimos del siglo pasado, se sublevaron, fijando su sede de operaciones en Canudos, en el interior del sertón, constituyendo una aguerrida tropa irregular que exigió grandes sacrificios del Gobierno para ser dominada. Por extensión, se llamó así a los componentes de grupos o bandas, puestos al servicio de los políticos locales o regionales y a quienes eran opuestos a ellos por los grandes hacenderos del interior. Dados sus particulares caracteres colección los ríos profundos sociológicos, es preciso no confundirlos con los cangaceiros ni con los simples bandidos o salteadores. La historia del yaguncismo, aún por hacer, revelará hechos importantes de la historia política brasileña” (ROSA, 2008, p. 547).
Mas a discrição do termo, além de ser insuficiente para dar conta dos fatores históricos e sociais inerentes à figura do jagunço[10], parece revelar também o desconhecimento ou certa ingenuidade do tradutor em relação a momentos cruciais da história brasileira, a exemplo do massacre que representou a Campanha de Canudos, e que foi retratado por Euclides da Cunha n´Os Sertões.[11] Neste caso, e para um leitor hispânico que não conheça a realidade do Brasil, o que fica é o olhar equivocado de Crespo: o movimento popular empreendido por Antônio Conselheiro e seus seguidores é resumido com o uso de “fanáticos” e a leitura do tradutor – “constituyendo una aguerrida tropa irregular que exigió grandes sacrificios del Gobierno para ser dominada” – parece justificar a barbárie que, no final das contas, foi a ação do Exército Brasileiro em Canudos, interior da Bahia.
Se de fato o sistema jagunço descrito por Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas é, como sugere Willi Bolle, “uma grande metáfora para designar o complexo de violência e miséria, a história dos sofrimentos do povo, a falta de justiça e de diálogo social (BOLLE, 2007, p. 144); e o jagunço uma figura chave para a compreensão da história político-social do país, ao optar por hispanizar o termo Crespo não estaria rompendo com o ato ético sobre o qual fala Antoine Berman (2013), desprezando também a ética da diferença de Venuti (2002), e sua relação com a(s) cultura(s)?
Ao escolher hispanizar o jagunço Crespo parece silenciar não apenas a alteridade do sertanejo rosiano[12], mas também o diálogo implícito com Os Sertões. Negando, ao leitor hispânico, a possibilidade de seguir aquilo que Bolle chamou, referindo-se ao Grande Sertão: Veredas, de aprendizagem de uma língua: “O romance é estruturado de forma que o leitor compartilha com o protagonista-narrador desse processo que é aprender e reaprender o significado da palavra “jagunço” no contexto político, social e econômico do Brasil” (BOLLE, 2000, p. 4).
E aqui podemos fazer a seguinte interrogação: Neste processo de aprendizagem do qual fala Bolle, o que tem a nos ensinar o julgamento de Zé Bebelo na Fazenda Sempre-Verde? A resposta, talvez, passe pelo fato deste episódio poder ser lido como o ápice do debate entre forças antagônicas – o sertão e a cidade; modernidade e atraso; o civilizado e o bárbaro; a lei do sertão e a Lei – que parecer ser instaurado por Guimarães Rosa ao longo de Grande Sertão: Veredas. Pois contradizendo as normas pelas quais eram regidos os homens que viviam à sombra do coronelismo e da jagunçagem, Zé Bebelo é capturado vivo[13] após o confronto com o bando de Joca Ramiro e levado a julgamento pelos chefes. Como homem de fora – “O senhor não é do sertão. Não é da terra” (ROSA, 2001, p. 277) –, que sonhava em conquistar e civilizar o sertão – “O senhor veio querendo desnortear, desencaminhar os sertanejos de seu costume velho de lei…” (ibid., p. 276) –, Zé Bebelo, ao ser derrotado na Chapada-da-Siriema-Correndo, parece representar, então, uma síntese alegórica do fracasso civilizatório.
Outro ponto que pode ajudar a responder a pergunta formulada anteriormente, e que para esta reflexão é o que se configura como o de maior relevância, é o fato da cena do julgamento ser o momento no qual a fala dos chefes e seus jagunços[14] ocorre de maneira mais direta – expondo, inclusive, as contradições do sistema no qual estavam inseridos:
“O julgamento de Zé Bebelo é a peça-chave de uma representação, retórica e mascarada, em que o sistema jagunço fala de si mesmo. Zé Bebelo, como mentor do protagonista-narrador, é um personagem-pivô entre duas esferas: ora o camaleônico aspirante a deputado, que luta contra os jagunços com um contingente misto de soldados e jagunços; ora o chefe de bandidos, que se veste com as insígnias tradicionais do jaguncismo, mas aproveita a primeira ocasião para tentar entregar os seus subordinados nas mãos das autoridades…” (BOLLE, 2000, p. 4).
Frente à complexidade da figura do jagunço em Grande Sertão: Veredas, e mesmo do sertão – enquanto espaço representativo de peculiaridades geográficas, históricas e culturais – não seria lícito questionarmos até que ponto o tradutor de Guimarães Rosa pode usar da liberdade de escolha, sem que isso implique no apagamento de traços históricos e culturais do sertão e suas gentes?
Encontrar uma resposta a esta questão talvez signifique trilhar o caminho da hospitalidade linguística (grifo nosso), sugerido por Paul Ricoeur – para quem “a tradução não implica apenas um trabalho intelectual, teórico ou prático, mas também um problema ético” (RICOEUR, 2011, p. 48). Ao tratar da tensão tradutória entre o estrangeiro (autor) e o próprio (leitor), Ricoeur defende que, na hospitalidade linguística do ato tradutório, “o prazer de habitar a língua do outro é compensado pelo prazer de receber em casa, na acolhida de sua própria morada, a palavra do estrangeiro” (RICOEUR, 2011, p. 30).
Referências
BERMAN, Antoine. A Tradução e a Letra ou o Albergue do Longínquo. Tradução de Marie-Hélène C. Torres, Mauri Furlan, Andreia Guerini. 2.ª ed. Florianópolis: PGET/UFSC, 2013.
BOLLE, Willi. O sistema jagunço. Texto apresentado durante o XXIV Encontro Anual da ANPOCS, ocorrido em Petrópolis, RJ, de 23 a 27 de outubro de 2000. Disponível em:
http://portal.anpocs.org/portal/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=4864&Itemid=357 Acesso em 10 de julho de 2016.
_________. Willi Bolle: Guimarães Rosa – Retrato da Alma do Brasil. Entrevista a Luiz Fernando Vitral. In: Revista FAPESP, ed. 69, out, 2001. Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br/2001/10/01/guimaraes-rosa-2/ Acesso em julho de 2016.
_________. O Brasil jagunço: retórica e poética. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil, n. 44, p. 141-158, feb. 2007. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/rieb/article/view/34566>. Acesso em 10 de julho de 2016.
CANDIDO, Antonio. O homem dos Avessos. In: Tese e antíteses: ensaios. São Paulo: T. A. Queiroz, 2002.
DEL OLMO, Francisco Calvo. Recepção de Grande Sertão: Veredas na Catalunha: Uma crônica. Scientia Traductionis, Florianópolis, n. 9, p. 206-217, jan. 2011. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/scientia/article/view/1980-4237.2011n9p206/18337 . Acesso em 07 ago. 2016.
RICOEUR, Paul. Sobre a tradução. Trad. Patricia Lavelle. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011.
ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
______. Gran Sertón: Veredas. Tradução de Ángel Crespo. Caracas: Fundación Editorial El perro y la rana, 2008.
______. Ave, palavra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
SCHLEIERMACHER, Friedrich. Sobre os diferentes métodos de tradução. Trad. Celso R. Braida. In: HEIDERMANN, W. (org.) Clássicos da teoria da tradução. 2. ed. Florianópolis: UFSC/Núcleo de Pesquisas em Literatura e Tradução, 2010. v. 1. (Antologia bilíngue).
VENUTI, Lawrence. Escândalos da tradução: por uma ética da diferença. Trad. Laureano Pelegrin, Lucinéia Marcelino Villela, Marileide Dias Esqueda e Valéria Biondo. São Paulo: EDUSC, 2002.
WASSERMAN, Renata. Mapeando os Sertões: Congruências. In: BERNUCCI, Leopoldo M. (org). Discurso, Ciência e Controvérsia em Euclides da Cunha. São Paulo: EDUSP, 2008.
[1] Mestranda e bolsista CAPES na Pós-Graduação em Estudos da Tradução (PGET) da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, Brasil. E-mail: vassia@uol.com.br.
[2] A afirmação de Antonio Candido encontra-se no ensaio “O homem dos Avessos” (2002), texto originalmente publicado com o título “O Sertão e o Mundo”, no nº 8 da revista Diálogo, em 1957. Foi publicado em livro em 1963, em Tese e antítese.
[3] Ver: SOARES, Cláudia Campo. Grande Sertão: Veredas: a crítica revisitada. In: Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 47, n. 2, p. 136-145, abr./jun. 2012. Disponível em:
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/11310/7715 .
[4] Em 06 de outubro de 1956, ano de lançamento da Grande Sertão: Veredas, Antonio Candido publicou uma resenha sobre o livro no Suplemento Literário do jornal O Estado de São Paulo antecipando, segundo artigo de Cláudia Campo Soares, “o encaminhamento que daria a reflexão em “O homem dos avessos”” (SOARES, 2012, p. 136, nota de rodapé).
[5] O referido ensaio encontra-se no livro Discurso, ciência e controvérsia em Euclides da Cunha, organizado por Leopoldo M. Bernucci (2008), e publicado pela Edusp, em 2008.
[6] A entrevista foi feita pela prima do autor, Lenice Guimarães de Paula Pitanguy, quando era ainda uma menina. Guimarães Rosa respondeu as perguntas por carta. O texto completo foi reproduzido em 2006, com autorização de Lenice Guimarães, pela revista Germina, v. 2, n. 3. Ver:
http://www.germinaliteratura.com.br/pcruzadas_guimaraesrosa_ago2006.htm Acesso em 5 de agosto de 2016.
[7] Esse rico material encontra-se hoje no arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), da Universidade de São Paulo.
[8] Ángel Crespo também foi responsável, nos anos 1960 e 1970, pela divulgação da literatura brasileira na Espanha – tendo inclusive criado, em parceria com João Cabral de Melo Neto, a Revista Brasileña de Cultura, que divulgava em seus números a produção dos modernistas brasileiros.
[9] Para a análise proposta por este trabalho foi fundamental o aporte, no que diz respeito às escolhas de Crespo, da pesquisa realizada por Marta Susana García, sob a orientação do professor, crítico e tradutor Berthold Zilly. Ver: GARCIA, Marta Susana. Grande Sertão: Veredas de João Guimarães Rosa – Análise textual da Obra e das duas traduções ao espanhol. Florianópolis, SC, 2015. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/160576 .
[10] O tradutor espanhol parece reconhecer a complexidade sociológica da palavra jagunço, já que no verbete do glossário ele alerta que “es preciso no confundirlos con los cangaceiros ni con los simples bandidos o salteadores” (ROSA, 2008, p. 547).
[11] Mesmo com toda a ambiguidade Euclides da Cunha no que diz respeito ao homem do sertão, em notas à segunda edição de Os Sertões, ele observa: “Não tive o intuito de defender os sertanejos porque este livro não é um livro de defesa; é, infelizmente, de ataque. Ataque franco e, devo dizê-lo, involuntário. Nesse investir, aparentemente desafiador, com os singularíssimos civilizados que nos sertões, diante de semibárbaros, estadearam tão lastimáveis selvatiquezas (…)” (CUNHA, 1998, p. 509-510).
[12] A ideia de alteridade defendida aqui tem como base a observação de Willi Bolle a respeito da fala direta do sertanejo nas duas obras em questão. Em entrevista dada a Luis Fernando Vitral e publicada na revista FAPESP (ed. 69, out., 2001), Bolle comenta: “em Os Sertões, na parte da Luta, eu contei 17 citações de fala de sertanejo; em Grande Sertão: Veredas são 1.300. Enquanto Euclides escreveu sobre o sertão de uma forma autorial, uma antropologia de autor, a antropologia e a etnografia de Guimarães Rosa se baseiam em ouvir o sertanejo falar e deixar o sertanejo falar. Em Rosa, a matéria-prima é a fala do sertanejo. Isso diferencia os dois escritores de maneira radical”. Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br/2001/10/01/guimaraes-rosa-2/ Acesso em 20 de julho de 2016.
[13] Zé Bebelo sai vivo da batalha graças à interferência de Riobaldo: “Digo ao senhor: eu gostava de Zé Bebelo (…). Como era possível, assim, com minha ajuda, a morte dele? (…) Aquela culpa eu carregava? Arresto gritei: – “Joca Ramiro quer este homem vivo! Joca Ramiro quer este homem vivo! Joca Ramiro faz questão!…” (ROSA, 2001, p. 268).
[14] Importa ressaltar que no referido episódio, além dos chefes – Hérmogenes, Sô Candelário, Ricardão, Titão Passos, João Goanhá –, Joca Ramiro deu palavra também aos “cabras valentes”: “Que por aí, no meio de meus cabras valentes, se terá algum que queira falar por acusação ou para defesa de Zé Bebelo, dar alguma palavra em favor dele? Que pode abrir a boca sem vexame nenhum…” (ROSA, 2001, p. 287).