“Otelo” pelo grupo Persona Cia de Teatro – Amanda Picinini Pagliosa

“Otelo” pelo grupo Persona Cia de Teatro

 

Amanda Picinini Pagliosa*

 

“Otelo”, Persona Cia de Teatro

“Otelo”, de William Shakespeare, apresenta em seu enredo temas variados como ciúme, traição, racismo e amor. A peça se passa em Veneza. Otelo, um general mouro e negro, apaixona-se por Desdêmona e casa-se com ela, mesmo contra a vontade do pai dela. O conflito principal é gerado por Iago, invejoso subordinado de Otelo, sente raiva pois Otelo promove Cassio a tenente. Desejando vingança, Iago convence Otelo de que Desdêmona o atrai com Cássio. Tomado pela dúvida e ciúme, Otelo acaba matando sua esposa asfixiada. É uma peça com características psicológicas marcantes, mostra os excessos e atitudes precipitadas que levam a erros irreparáveis, uma abordagem que aparece em diversas peças como em “Romeu e Julieta”.

Bárbara Heliodora em seu texto “Otelo, uma tragédia Construída sobre uma Estrutura Cômica” relaciona a obra “Otelo” com a Commedia Dell’arte. De fato, é fácil aproximar vários elementos da comédia à estrutura da peça, mesmo está sendo uma tragédia. Os personagens apresentam características da Commedia Dell’arte, como Iago que se assemelha ao Zenni ou Briguela, um criado que age por interesse próprio querendo a promoção, o casal de enamorados como o casal principal, e o objeto que tem um importante papel, desempenhado pelo lenço de Desdemona. A peça parece uma comédia, até certo ponto, se espera que o conflito se resolva ou que algum fato esclarecedor aconteça para a sua resolução, mas isso não acontece, o conflito cresce em uma proporção exagerada que leva a morte de personagens. A peça é muito ampla e diversificada, no sentido de que, pode se pensar em várias interpretações, sendo amplamente discutida, por exemplo, seria o Iago um “alter ego” de Otelo?

Em Florianópolis, a companhia Persona Cia de Teatro, dirigida por Jefferson Bittencourt, estreou seu espetáculo “Otelo”, baseada na obra de Shakespeare. Uma adaptação contemporânea, que modificou alguns elementos da peça como: a história se passa em uma empresa; o responsável pelo conflito Iago é transformado em Iara, uma secretária; Otelo é loiro e presidente da empresa; um personagem importante, que é pai de Desdêmona, foi retirado da peça. Isso gera alguns questionamentos se comparada com a obra original. Será que mudanças como essas podem comprometer a história? Agregam novas interpretações ou significados diferentes?
Já em sua estreia, o espetáculo “Otelo” dirigido gerou opiniões opostas sobre a qualidade de seu conteúdo. É uma proposta diferente, sem dúvida, que por vezes parece desviar do objetivo ou do tema. As mudanças realizadas na peça, como um Otelo loiro não parece significar nada, e nem leva a outra interpretação. A mudança de Iago por Iara, já apresenta uma mudança significativa assim como também o ambiente se tratar de uma empresa, onde os princípios éticos são outros e o comportamento esperado é completamente diferente. O uso abusivo de drogas e bebidas alcoólicas proporcionou um lado cômico apreciado pela plateia, porém, trouxe outra característica para a personagem. O lenço, um elemento importante para o enredo, parece não se encaixar no contexto atual da adaptação, assim como a mistura de falas formais da obra original com a maneira de falar do dia a dia, uso de palavrões e expressões bem atuais. Na peça, apenas a história se manteve, alguém que, por interesse, influência o marido ciumento a acreditar em uma traição, que acaba com um desfecho trágico. Se analisarmos os personagens elaborados por Shakespeare, parece haver um distanciamento da essência dos personagens que se aproximavam da Commedia Dell’arte. Será que isso é suficiente para prejudicar a qualidade da peça?

A adaptação apresenta fatores muito interessantes como iluminação, cenário e trilha sonora, bem administrados pelo diretor. Independente das opiniões, vale a pena ser assistida, assim como qualquer outra peça, ou até mesmo filmes, baseadas nas obras de Shakespeare.

*Aluna do curso de Artes Cênicas da UFSC