Qorpus entrevista o poeta e tradutor francês Jacques Demarcq
Qorpus entrevista o poeta e tradutor francês Jacques Demarcq
Tradução de Marina Veshagem
Q: Você já traduziu E.E. Cummings, Gertrude Stein, Wiliam Carlos Williams. Você poderia falar de seu trabalho como tradutor? Quais são as dificuldades ao traduzir a vanguarda americana para o francês?
JD: Traduzir poemas é sempre um desafio, seja de vanguarda ou não. Eu tenho alguns hábitos: 1º traduzir grandes blocos, o que perdemos aqui podendo ser recuperado em outra parte do livro, 2º perguntar-se o que o autor teria escrito com as mesmas intenções e jogos formais na língua de chegada (no meu caso o francês), 3º forçar, de acordo com a necessidade, as normas da língua de chegada, 4º manter distância dos preconceitos do autor, dos quais não somos sempre obrigados a partilhar.
Q: Como é a recepção deste tipo de tradução na França?
JD: Varia bastante. Tudo depende do livro, mais ou menos fácil, do editor, mais ou menos conhecido e bem ou mal difundido. Para minha tradução de 95 Poems de Cummings, atualmente em versão de bolso a um preço módico, cerca de cinco mil exemplares foram vendidos desde a primeira edição, há 30 anos. Para as traduções de Cummings mais recentes, varia entre 400 e 1500 exemplares em dois anos. De Stein, eu traduzi e publiquei faz nove anos Tender Buttons, que era estranhamente inédito; ele vendeu cerca de mil exemplares, sem qualquer divulgação na imprensa. As traduções de livros de poemas, de qualquer forma, quase não interessam à imprensa, até mesmo intelectual. Funciona melhor publicar antologias bilíngues, o que também fiz também para Cummings. W.C. Williams, do qual publiquei apenas um pequeno livro (além de poemas revisados) que teve praticamente a mesma recepção que Cummings.
Q: Como Gertrude Stein é lida hoje em Paris, cidade na qual ela viveu?
JD: Gertrude é uma celebridade, sem dúvida mais como colecionadora de arte do que como escritora. Participei de uma grande exposição que foi dedicada a ela e seus dois irmãos em 2011, em Paris. Como escritora, ela é muito respeitada por alguns quarentões franceses (portanto, mais jovens do que eu) que não são exatamente vanguardistas, esta noção não tendo mais validade na Europa que envelhece: Nathalie Quintane, por exemplo. O essencial de sua obra foi traduzido em francês, entre 1930 e 1980.
Q: Você é poeta. Sua poesia foi influenciada pelos autores que você traduziu?
JD: Certamente: a tradução é um exercício que deixa marcas, como ter sido marinheiro por muito tempo, policial ou dançarino. Seguir formas novas e uma ou duas línguas estrangeiras (italiano, inglês) ajuda a inventar suas próprias formas, a inventar sem parar e muito, assim como tomar a liberdades com sua própria língua. Traduzir é ler com o máximo de atenção, e nenhum escritor pode prescindir de ler os outros.
Q: Você pode me enviar alguns poemas de seu livro Les Zozios?
JD: Na última vez (faz dois meses) eu te enviei o começo de Zozios, ou seja, uma série de sonetos bastante herméticos. Eu te envio a continuação, às vezes fácil, outras vezes menos. É um livro deliberadamente eclético, um conjunto, com um fio biográfico, mas imperceptível. Eu trabalho há quatro anos em um segundo volume; o primeiro me tomou 20 anos.
(Um dos poemas do livro, Les Zozios)
la frégate
Au Pacifique,à 10 000 kilomètres de là, flâneusement frégate plane. Sur un divan tiède elle dérive, dans la touffeur de laine suintante soupirée par le golfe à chaque effort de sa houle.Effleure-t-elle même l’atmosphère? Une mouette à côté a l’air de pédaler pour gagner l’étape, un pélican de secouer son linge trempé.Elle,au grand large étale uniment, d’écailles pourquoi 20, 30 goélands viennent secs! – labousser, nul éclat ne saurait faire ciller ses rémiges; nulle odeur palpiter,d’algue cuite ou de cuir moisi :ni de ces carnes à la casse, exorbitées, dont la plage entière dégoutte. Offrant des yeux,de loin,quelque las,traînant coup de bec,un pas lui échappe-t-il : c’est pour s’en éventer! ou que? déjà vautours comme fatalement s’y vautrent.Le pauvre fou,toujours est-il, & la sterne avec : consternés de leur méprise. En diagonale elle a piqué, raflé à ces plumés barboteurs, barboté leur prise,en rafale. Célérité de scélérate : à faire vomir. Elle glisse au-dessus, & … le mirage vert argent de la mer l’enduit de… [s i l e n c e]. Du bout des doigts comme au piano crochant,au ras des flots calmar, exocet, méduse ou tortue (soudain exhaussé le tordu qui s’ennuyait sous l’aile maternelle des vagues, sans doute) jamais frégate ne se mouille. Étouffant des couvées de becs, leurs nids anéantis si les voisins n’y prennent garde:pirate! ou fantôme qui dans son vol se voile,sa noirceur trahie par aucun pli quand sur l’opéra du crépuscule elle s’ét-i–r—-e
{
entourée du lent somnolent ballet de ses sœurs… Tellement que toute raison se perd à rêver quelles cordes par quel?!? sinistre dieu grattées soutiennent cette mélopée de charmes à la décharge des fléaux d’un mobile dont les incontournables circonvolutions vous enlisent dans l’épaisseur molle du vide. Un bouquet dans la vase, oui. Et la frégate tourne. Plan fixe, elle fait image : légère qui s’évade ensemencée d’élan la courbe d’une phrase à son corps se moulant. Le soleil, rabaissé, ne salive plus que bribes mielleuses entre les lèvres tuméfiées de mauve de l’horizon, qu’en vol (encore) – uptueuses volutes sur les bouffées régurgitées d’une mare – mythe : les maraudeuses déroulent leur syntaxe. Tournure si ailée, si nette & si niée (signée de spirales sibyllines) qu’ailes paressent ensorciéleuses à dévider l’hypnotoile d’araignée de la nuit, depuis des nues s’effilochant quenouilles. Sinuant ci, & là bientôt, s’immuant outre-vue dans l’immensité de son nulle part chacune. À plumes tour & re tour -noyer dans l’encrier ces cris dont vocables ou volatiles cribleraient l’obscurité si, zélée, sainte assez pour les en – rouer, elle n’exciellait à abs – orber jusqu’à l’ellipse! ces poisons d’énergumène énergie qui (loin de l’arêter) lui font noire sillonner sans fond le noir de son disque rayé,à la mélancolie.